ANTOLOGIA UBALDIANA
APRESENTACÃO
Apresento-me como homem.
A Entidade que me inspira mediunicamente e sobre mim exerce autoridade, no pensamento e na ação deve ter um representante terreno, alguém que assuma todo o peso da luta e da responsabilidade; que totalmente se exponha, moral e fisicamente, aos perigos de uma realização novíssima, ao trabalho que toda grande conquista e todo progresso impõem, os necessária tensão para ultrapassar todos os obstáculos.
Tal sou e assim me coloco hoje, ao ingressar na vida pública.
Nada possuo além do meu trabalho para viver e da minha obra para triunfar no bem. Dentro de mim e acima de mim, porém, vibra uma Voz que infunde respeito, que me arrasta e a todos irresistivelmente arrastará, voz que eu escuto e a que devo obedecer.
Já não é mais o momento de dizer — o tempo virá, mas, sim, de afirmar — o tempo chegou. Chegou a hora da grande ressurreição espiritual do mundo.
Eis o que sou: o servo desta Potência, o servo de todos, a serviço de todos, para o bem de todos. Nada mais me pertence, nem alma nem corpo: pertenço ao bem da humanidade. Deverei ser o primeiro no trabalho, na dor, na fadiga e no perigo; e o primeiro serei nesse caminho e me esgotarei até a última dose de minha energia, até o último espasmo de meu lamento, até a última explosão de minha paixão.
Sou fraco, culpado e indigno; não tenho, porém, mais força para sufocar esta Voz que deseja explodir e falar ao mundo, arrastar os povos, abalar os poderosos, convencer os doutos e todos conduzir a uma vida de bem e de felicidade. Serei considerado louco, bem o sei. Mas, Sua Voz tem um poder ao qual não mais sei resistir. E eu, o último dos homens, falarei ao mundo com palavras novas, num tom altíssimo, de coisas grandes e tremendas, em nome de Deus.
Estremeço e choro, ao escrever estas palavras. E o sinal positivo de que Ele, o Espírito que me assiste, está junto de mim e me faz escrever coisas que são incríveis.
Não obstante, as almas simples sentem, com um sentido que a ciência não tem e nunca terá, sentem por intuição de afetos e por penetração de amor, a completa naturalidade e a perfeita credibilidade destas coisas incríveis.
Tão intensamente profunda é essa intuição que a alma juvenil dos povos do outro hemisfério a sentiu, rápida, vibrante, espontânea, num reconhecimento que dizia: eu sei, em face da demorada, duvidosa e sofística análise científica da velha Europa. É que a ciência analisa, toca e mede, mas não tem alma e somente com o cérebro nada se pode "sentir".
Brasil, terra prometida da nova revelação, terra escolhida para a primeira compreensão, terra abençoada por Deus para a primeira expansão de luz no mundo! Já um incêndio lá se levanta; instantânea e profunda foi a compreensão. Foi um reconhecimento sem análise, de quem sabe porque sente, de quem tem certeza porque vê. Os humildes, não solicitados, compreenderam e se afirmaram os primeiros, sem provas, sem discussões, no terreno em que a ciência que tudo sabe nunca cessa de exigi-las.
A profunda emoção que me invade ao falar-vos, o espasmo de paixão que me arrebata, o rasgar-se de meu coração a cada palavra não se podem medir nem calcular; mas, vós o sentis, embora a tão grande distância de tempo e de espaço! As lágrimas que me comovem enquanto escrevo, e caem sobre este papel, destas palavras ressurgirão e cobrirão vossos olhos quando as lerdes. E direis, irresistivelmente: "É verdade". E através dos anos convencerão e arrastarão outras almas que as vão ler e que, como vós, também dirão, irresistivelmente: "É verdade".
Porque a força que me arrebata também vos arrasta, a paixão que me inflama também vos incendeia e nos une a todos, num só esforço, numa tensão e num trabalho comuns, em favor do Bem. Como é grande e bela esta felicidade ilimitada de nos sentirmos todos irmãos, profundamente irmãos, diante dessa maravilhosa Voz que do Infinito a todos nos alimenta! Como é doce, diante Dela, ensarilhar as tristes armas da rivalidade e da competição que pesam sobre nós e nos amarguram a vida. Que grandioso e sentirmo-nos todos unidos, numa só Humanidade, num compacto organismo; não mais como pobres seres solitários num mundo inimigo, mas cidadãos de um grande universo, onde cada ato tem um alvo, onde toda vida constitui missão.
A Voz me arrebata neste momento e senhoreia-se de minha mão, como o faz sempre que deseja falar por meu intermédio. Eu A sigo, pequenino, confuso maravilhado por imensas visões.
Agora Ela me apresenta o planeta envolto numa faixa de luz e me faz ver uma humanidade mais feliz e mais sábia, ressurgindo das ruínas da geração de hoje; mas, também a ela pertenceremos e, quem houver semeado, colherá. Acima de nós que, lutando e sofrendo, semeamos, uma falange de Espíritos Puros estende-nos os braços, encorajando-nos e ajudando-nos. Somos os operários de um grande trabalho, do maior trabalho que o mundo jamais realizou: a fundação da nova civilização do terceiro milênio.
Mãos à obra! Levantai-vos É chegado o momento. A palavra de Sua Voz encerra uma força misteriosa, intrínseca, invisível, mas poderosa; imponderável, mas irresistível, e por ela sozinha avança, sabendo por si mesma escolher os meios humanos, solicitando-os a todos, convidando à colaboração todos os homens de boa vontade. Ela avança e atinge os corações; persuade e convence, possuindo e ofertando a cada momento, de si mesma, uma prova evidente, o fato inegável de sua automática divulgação.
Mãos à obra! Espera-me, espera-nos um tremendo trabalho, mas também uma imensa vitória. Somente sob a direção de um Chefe sobre-humano o mundo poderia empreender uma obra tão gigantesca. Temos um Chefe no céu. Ele não traz senão a paz, o amor, o respeito a todas as crenças. Nada tem Ele a destruir do que seja terreno; a ninguém Ele agride; não toca a forma, que não é o essencial: encara a substância. Nada tem Ele a modificar do que seja terreno neste mundo; tudo quer vivificar com uma chama de fé, quer tudo aquecer com uma nova paixão de amor puro — o amor de Cristo esquecido.
Nada tem a temer as autoridades nem o organismos humanos. É tão velho e inútil o expediente de modificar as organizações! Não mais criações de sistemas sempre novos e sempre velhos, mas criação do homem novo, que tem origem, no íntimo, onde está a alma e não no exterior. Toda organização e boa quando o homem é bom; é má quando mau é o homem.
O novo Reino não é deste mundo e jamais se tocará no que lhe pertence. Não está surgindo um novo organismo humano, com chefes e subordinados, com cargos e funções, com propriedades e direitos. Não. Absolutamente nada disso. Trata-se, eu vos digo do Reino de Deus, do Reino que o mundo ainda espera, que o mundo ainda invoca: “Veniat Regnum tuum”. É um reino de almas, de amor e de paz; não possui sedes, não tem riquezas, nada possui; não tem senão a tarefa do dever, o amor do bem, a paixão do sacrifício, a grandeza do martírio. E quem for o primeiro nesse caminho será o maior nesse Reino de Deus.
Almas distantes, que no Brasil tudo compreendestes, distantes pelo espaço, mas tão perto do coração, que o meu abraço vos chegue forte, profundo, imenso, como eu o sinto agora, nesta solidão montanhosa de Gúbio, no mais alto silêncio da noite, com minha alma nua diante de Cristo, cujo olhar me penetra, me envolve e me vence.
Humildemente, como o último dos homens que sou, eu vos suplico, pela compaixão que pode inclinar-vos para o mais frágil e abatido dos seres: ajudai-me a compreender este mistério tremendo que em mim se processa, ajudai-me a cumprir esta obra imensa cujos limites não alcanço.
(Pietro Ubaldi, Gúbio (Itália), na noite de 6 de fevereiro de 1934 - “Fragmentos de Pensamento e de Paixão”, 1a. Parte)
PROGRAMA
“Ama a teu próximo como a ti mesmo”
Depois do escrito anterior - “Apresentação” - importa, de imediato, precisar os conceitos para evitar mal-entendidos, falsas interpretações, transposição de metas e de princípios.
O conceito de Sua Voz é claro e exato. Aqui o exponho com o menor número possível de palavras, cristalino e adamantino qual o sinto explodir em mim, para que resista a todo choque e a qualquer desvio.
O princípio e o conteúdo do movimento são estrita e exclusivamente evangélicos.
Tudo aquilo que não pode permanecer no Evangelho de Cristo não pode igualmente permanecer neste movimento. Não é possível distorcer em nenhum sentido estas palavras.
As consequências são, de igual modo, simples e evidentes.
O movimento e quantos dele participam devem manter-se dentro do princípio fundamental do Evangelho: "Ama a teu próximo como a ti mesmo". Não existe outro caminho possível. Quem não puder assimilar este princípio espiritual naturalmente estará excluído.
O movimento, qual o Evangelho, é apolítico e supernacional. É simplesmente humano em sua universalidade. E interior e espiritual, não externo nem material, a não ser em suas últimas e inevitáveis consequências, as quais não tocam, de modo algum, nas normas humanas, absolutamente fora de seus objetivos e de qualquer discussão.
Assim sendo, o movimento é também super-religioso, pois não atinge nenhuma expressão religiosa, mas as respeita todas, antes de tudo reconhecendo-as, tanto que as envolve todas num único amplexo. Assim faz do dividido pensamento humano uma potência de concepção unitária, das separadas e multiformes crenças um ímpeto concorde de fé, de esperança e de paixão para um Deus que deve ser o mesmo e uma Verdade que deve ser a mesma, para todos.
Como tal, o movimento a todos convoca para que todos se unam em colaboração. Eis porque não existirão, como já se disse no precedente escrito, nem chefes, nem subordinados, nem cargos, nem funções, nem propriedades, nem direitos, nem sedes, nem riquezas. A edificação deve efetuar-se, para cada um, no íntimo da própria alma, qual obra e construção sua. Indistintamente, todos são chamados à colaboração, para que cada um seja o criador, no próprio coração, do Reino de Deus.
Os meios humanos são, portanto, todos excluídos, porque não necessários. O novo Reino deve nascer, não nas organizações humanas, mas no coração dos homens. E cada um deve realizar essa criação antes de tudo em si mesmo, tornando-se melhor.
Não é, pois, preciso outro Chefe senão Deus, nem outro comando exceto a voz justa da consciência. Dir-me-eis, porém: Isto não basta para fazer uma religião. E eu vos digo: Não se trata de uma religião, mas de uma força que deve reavivar todas as religiões existentes.
Para quem discordar, não existe qualquer dispositivo de coerção como nas normas humanas, senão a perda automática da posição privilegiada de seguidor de Cristo — a perda da proteção da Lei justa de Deus. Isso significa uma rendição à feroz lei terrestre da luta e da força sem justiça. A Lei Divina, sempre presente, no interior das coisas e dos seres, não admite mentiras, porquanto é imanente na consciência. Não admite violações nem fugas, por situar-se no mais íntimo do espírito humano. Eis a absoluta novidade deste movimento na história de todas as experiências humanas. Dele são excluídos: comando, riqueza, força. Ele é construção eterna e não pode, por isso, usar senão materiais eternos. Cada empreendimento é uma construção cuja durabilidade depende dos materiais utilizados. Quem usar da espada perecerá pela espada; quem usar da violência pela violência perecerá, pois os meios usados como causa recaem depois, por força da Lei Eterna, inexoravelmente, como efeito sobre seu agente.
Se o movimento não atender a estes princípios será ilusório e caduco, como todas as coisas humanas E qualquer elemento humano que nele introduzirdes ser-lhe-á como um caruncho destruidor, uma força lenta continuamente em tensão para a destruição.
Como movimento social, inspira-se, portanto, em princípios nunca usados pelo homem na história do mundo. Por estas características, reconhecereis que ele vem do Alto, de um mundo não vosso, porque nenhum elemento vosso nele é introduzido nem nele está contido; ao contrário é cuidadosamente excluído.
A imediata consequência prática desta claríssima tomada de posição diante do mundo é a seguinte: Se todos são admitidos, contanto que puros e honestos de coração, são automaticamente excluídos aqueles que tais não são. Depuração, portanto, por força íntima da realidade.
(Gúbio (Itália), na noite de 12 de fevereiro de 1934 - “Fragmentos de Pensamento e de Paixão”, 1a. Parte)
A VERDADEIRA RELIGIÃO (1952)
Encontrei-me, viajando pelo mundo, em todos os ambientes.
Achei-me entre católicos e os observei. Muitos deles eram sinceros e convictos e viviam aplicando, realmente, os princípios de sua religião. Sua verdadeira fé me encheu de admiração. Outros deles, porém, embora verbalmente se confessassem e nas práticas religiosas se manifestassem perfeitamente ortodoxos, não viviam inteiramente seus princípios, demonstrando com fatos que, em realidade, neles não acreditavam de modo absoluto. Isso me encheu de tristeza.
Achei-me, depois, entre os protestantes e os observei. Muitos deles eram sinceros e convictos e viviam aplicando, realmente, os princípios de sua religião. Sua verdadeira fé me encheu de admiração. Outros deles, porém, embora verbalmente se confessassem e nas práticas religiosas se manifestassem perfeitamente ortodoxos, não viviam inteiramente seus princípios, demonstrando com fatos que, em realidade, neles não acreditavam de modo absoluto. Isso me encheu de tristeza.
Achei-me, também, entre os espiritistas e os observei. Muitos deles eram sinceros e convictos e viviam aplicando, realmente, os princípios de sua doutrina. Sua verdadeira fé me encheu de admiração. Outros deles, porém, embora verbalmente se confessassem e nas práticas formais se manifestassem aderentes à sua doutrina, não viviam inteiramente seus princípios, demonstrando com fatos que, em realidade, neles não acreditavam de modo absoluto. Isso me encheu de tristeza. Achei-me, depois, entre os teosofistas, os maçons, es maometanos, os budistas etc. e observei o mesmo fenômeno.
Encontrei-me até entre ateus, materialistas convictos. Não obstante, entre eles encontrei os que procuravam viver segundo superiores princípios de retidão. Senti respeito por eles. Qualquer convicção vivida com retidão merece respeito. O que me encheu de tristeza foi ver o ateu, materialista animalescamente involvido, somente animado de instintos egoístas para prejudicar o próximo.
Observando-os todos, perguntei a mim mesmo, então: a divisão real, verdadeira, entre os homens, é a de uma religião, doutrina ou crença, ou é, antes, entre o homem sincero e honesto e o homem falso e desonesto, que se encontram no seio de todas as religiões, doutrinas e crenças? Embora as várias divisões humanas, em cada uma delas sempre encontrei esta outra divisão universal de bons e maus.
Perguntemos a nós mesmos, então: não será esta a verdadeira distinção, muito mais real que a outra em que tanto se insiste? Pertencer ao primeiro tipo de homem, antes que ao segundo, não será muito mais importante e decisivo do que pertencer a um determinado agrupamento religioso? Que importa pertencer a esta ou aquela religião, quando não se é sincero nem honesto? Não é o fundamental em qualquer campo? E não é, então, esta a mais importante entre todas as divisões humanas, muito mais do que a atualmente aceita? Não será essa a divisão que Deus mais assinala, de preferência a outra, que se refere, mais que a bondade do homem, aos interesses humanos que em torno dela se agrupam?
Qual é o fato mais decisivo para a edificação do homem (isso constitui o objetivo de todas as crenças) — os pormenores dogmáticos e doutrinários, a ortodoxia da letra ou o haver compreendido o simplicíssimo princípio do bem e do mal, princípio universal, existente em todas as religiões, inscrito no espírito humano e, sobretudo, viver esse princípio?
A verdadeira distinção, nesse caso, não é a atualmente vigorante em nosso mundo — católicos, protestantes, espiritistas, teosofistas, maçons, maometanos, budistas etc. — mas, sim, o justo e o injusto. Esta é a distinção substancial, a que tem valor diante de Deus, muito mais importante que a outra, que pode ser apenas formal. Na segunda se pode mentir e ela, então, é fictícia; nunca na primeira, que é real.
Por que, então, tantas lutas religiosas e doutrinárias? Não têm elas outro valor senão o de defender o patrimônio conceptual do grupo e os interesses que dele dependem. Por que, então, não reduzir todas as crenças a esse seu denominador comum, que é a sua substância, em que todas se encontram, além de todas as divisões? E por que não achar nessa substância a ponte que as une todas numa característica comum, em lugar de procurar em especulações sutis que pode dividí-las? Por que não parar e insistir no que importa acima de tudo; a bondade e a evolução do homem?
Tudo isso é importantíssimo para a fusão das almas no caminho da unificação, que é o futuro do mundo em todos os campos. Daí nasceria um grande respeito recíproco, uma nova possibilidade de compreensão, um superior espírito de fraternidade. O cioso amor à ortodoxia, justificável em outros tempos, excitado até o ponto de preferir a letra ao espírito, pode significar uma satânica falsificação da fé na psicologia farisaica, enfermidade de todos os tempos e de todas as religiões. Pode, então, acontecer que se faça da religião o que sempre se tem feito do amor à pátria que, embora santo em si, se transforma em agressividade e guerras contra outras pátrias. Ora, como esse tipo de amor nacional está hoje em vias de desaparecimento, superado pela vida que caminha para a unificação social, do mesmo modo a vida superará o espírito de absolutismo e intransigência, pois ela se dirige para a unificação religiosa.
É necessário, assim, abandonar o espírito separatista de domínio, em nome de absolutismos, numa verdade que na Terra, para o homem, não pode deixar de ser relativa e progressiva, isto é, em função de sua capacidade evolutiva.
A vida hoje caminha para a colaboração por compreensão em todos os campos e os imperialismos, políticos ou religiosos, pertencem a fases que estão sendo superadas. Os imperialismos espirituais retardam a unificação, que se situa justamente no campo das convicções e das consciências e que não se pode obter com o espírito de absolutismo e de domínio.
Qual é, pois, a religião de substância em que poderão pacificar-se todas as distinções humanas, encontrando-se em seu denominador comum?
A religião de substância é somente uma. A ela pertencem todos os honestos que crêem sinceramente e vivem suas crenças, sejam católicos, protestantes, espiritistas, teosofistas, maçons, maometanos, budistas etc.. Estão, ao contrário, fora da religião, todos os falsos, os injustos, os que interiormente não crêem (embora formalmente em seus lugares), os que não vivem suas crenças, sejam católicos, protestantes, espiritistas, teosofistas, maçons, maometanos, budistas etc. Estes se igualam no representar a traição a ideia que professam.
Na "Mensagem de Natal" de 1931, diz Sua Voz: “...não está longe o dia em que somente uma será a divisão entre os homens: justos e injustos.” Na Terra, em todos os campos, existem sempre dois tipos humanos: o evolvido e o involvido. Encontram-se em todas as filosofias, governos, religiões, hierarquias e povos.
O envolvido vive sempre no nível animal, é animado pelo espírito de dominação e, por isso, intransigente e agressivo; fecha-se na forma, desprezando a substância; é mais ligado à Terra que ao céu. julga-se, em todos os campos, sempre com a posse da verdade e da parte de Deus, julgando todos os outros como situados no erro e da parte de Satanás. Tende à egocêntrica monopolização da Divindade. O evolvido tem características opostas. Vivendo num nível mais alto, é animado pelo espírito de fraternal compreensão; tolera e auxilia; fala com o exemplo, dando e não dominando; é mais aderente à substância que à forma, mais unido ao céu que à Terra. Não julga nem condena. Tende a anular seu eu em Deus e no amor ao próximo. Não se faz paladino da verdade para exigir virtude dos outros, mas começa por praticá-la, ele mesmo: ilumina, não impõe, pois respeita as consciências. Não pretende ser o único que tem Deus consigo. Não identifica com o mal tudo que está fora de seu eu, do seu grupo ou hierarquia nem o condena em defesa própria. Não se faz representante de Deus para dominar com sua personalidade, mas reconhece em Deus o Pai de todos.
O homem está evolvendo e a religião dos justos será a religião unitária que a todos entrelaçará. O estado vigente até hoje corresponde à fase caótica do mundo. Ele caminha, porém, para a fase orgânica na qual, em todos os campos, os relativos pontos de vista se coordenarão numa verdade universal.
A religião una será a substancial, a religião do bem e dos bons, que se compreenderão, por serem evolvidos. Para essa compreensão os involvidos ainda não estão maduros, pois só podem crer que a salvação depende apenas da filiação a esta ou aquela forma da verdade, sem cuidar da substância, que pode estar em todas as formas. Tudo isso, porém, será fatalmente superado.
É lei de evolução que o dualismo, em que se dividiu nosso universo, gradativamente, em todos os campos se vá reconstituindo em sua originária unidade de que o espírito caiu na cisão, na forma, na matéria. É fatal lei de evolução que chegue finalmente à Terra a tão esperada realização do Reino de Deus.
(“Fragmentos de Pensamento e de Paixão - Primeira Parte)
O HERÓI
Afrontando o aguilhão torvo e escarninho
De sarcasmos e anseios tentadores,
Ei-lo que passa sob as grandes dores,
Na grade estreita do terrestre ninho.
Relegado às agruras do caminho, Segue ao peso de estranhos amargores, Acendendo celestes resplendores, Atormentado, exânime, sozinho...
Anjo em grilhões de carne, errante e aflito, Traz consigo os luzeiros do Infinito, Por mais que a sombra acuse, gema e brade!
E, servindo no escuro sorvedouro, Abre ao mundo infeliz as portas de ouro Para o banquete da imortalidade.
Cruz e Souza
(Soneto psicografado por Francisco Cândido Xavier em Pedro Leopoldo-MG, dedicado ao Professor Pietro Ubaldi no dia 18 de agosto de 1951, em homenagem aos seus 65 anos)
EMMANUEL E A GRANDE SÍNTESE
Seguimos na celebração dos 90 anos do início da redação de "A Grande Síntese", de Pietro Ubaldi, e dos 50 anos da desencarnação de seu autor, lembrando textos e episódios ligados à sua história. Hoje, trazemos a abençoada mensagem de Emmanuel sobre a Obra Prima da coleção Ubaldiana, que veio posteriormente a ser utilizada como prefácio de todas as suas edições brasileiras.
"Quando todos os valores da civilização do Ocidente desfalecem numa decadência dolorosa, é justo que saudemos uma luz como esta, que se desprende da grande voz silenciosa de A Grande Síntese.
Na mesma Itália, que vulgarizou o sacerdócio romano, eliminando as mais belas florações do sentimento cristão no mundo, em virtude do mecanismo convencional da igreja católica, aparelhos existem da grande verdade, restaurando o messianismo, no caminho sublime das revelações grandiosas da fé.
A palavra do Cristo projeta nesta hora as suas irradiações enérgicas e suaves, movimentando todo um exército poderoso de mensageiros seus, dentro da oficina da evolução universal. O momento é psicológico. As nossas afirmativas abstraem do tempo e do espaço, em contraposição às vossas inquietudes; mas, o século que passa deve assinalar-se por maravilhosas renovações da vida terrestre.
As contribuições exigidas serão bem pesadas. Todavia, uma alvorada radiosa sucederá às angústias deste crepúsculo.
Aqui fala á Sua Voz divina e doce, austera e compassiva. No aparelhamento destas teses, que muitas vezes transcendem o idealismo contemporâneo, há o reflexo soberano da sua magnanimidade, da sua misericórdia e da sua sabedoria. Todos os departamentos da atividade humana são lembrados na sua exposição de inconcebível maravilha!
É que, sendo de origem humana a razão, a intuição é de origem divina, preludiando todas as realizações da Humanidade. A grande lição desta obra é que o Senhor não despreza o vosso racionalismo científico, não obstante a roupagem enganadora do seu negativismo impenitente.
Na sua misericordiosa sabedoria, Ele aproveita todos os vossos esforços, ainda os mais inferiores e misérrimos. Toma-vos de encontro ao seu coração augusto e compassivo, unge-vos com o Seu amor sem limites, renovando os Seus ensinamentos do Mar da Galiléia.
Vede, pois, que todos os vossos progressos e todos os vossos surtos evolutivos estão previstos no Evangelho. Todas as vossas ciências e valores, no quadro das civilizações passadas e no mecanismo das que hão de vir, estão consubstanciados na sua palavra divina e redentora.
A Grande Síntese é o Evangelho da Ciência, renovando todas as capacidades da religião e da filosofia, reunindo-as à revelação espiritual e restaurando o messianismo do Cristo, em todos os institutos da evolução terrestre.
Curvemo-nos diante da misericórdia do Mestre e agradeçamos de coração genuflexo a sua bondade. Acerquemo-nos deste altar da esperança e da sabedoria, onde a ciência e a fé se irmanam para Deus.
E, enquanto o mundo velho se prepara para as grandes provações coletivas, meditemos no campo infinito das revelações da Providência Divina, colocando acima de todas as preocupações transitórias, as glórias sublimes e imperecíveis do Espírito imortal".
Pedro Leopoldo, Outubro de 1938
(Mensagem recebida por Francisco Cândido Xavier).
ERNESTO BOZZANO E A OBRA UBALDIANA
Ernesto Bozzano (Gênova, 9 de janeiro de 1862 — 24 de junho de 1943) foi professor de Filosofia da Ciência na Universidade de Turim, Itália, e um dos maiores e mais respeitados estudiosos da fenomenologia espírita de todos os tempos. Membro honorário da “Society for Psychical Research (SPR)”, de Londres; da “American Society for Psychical Research (ASPR)”, de Nova Iorque e do “Institut Métapsychique International (IMI)”,de Paris; e correspondente dos principais nomes da pesquisa mediúnica e parapsicológica de seu tempo, produziu dezenas de monografias especiazadas no tema, e uma ampla e respeitada bibliografia científica sobre os mais variados aspectos dos fenômenos mediúnicos, traduzidos em diversos idiomas e preservados até hoje pela Fondazione Biblioteca Bozzano - De Boni.
Sendo portanto italiano e contemporâneo do prof. Pietro Ubaldi (Foligno, 18 de agosto de 1886 - São Vicente, 29 de fevereiro de 1972) era natural que fosse consultado por este quando da captação das primeiras de suas Grandes Mensagens e, logo na sequência, de “A Grande Síntese”. As respostas às consultas feitas vieram sempre prontas, gentis, repletas de incentivo e reconhecimento ao trabalho que ali se iniciava promissor, marcado desde o princípio por extraordinário conteúdo moral e científico.
Alma franciscana, humilde por natureza, Ubaldi não se acanha de consultar ao então já famoso compatriota logo quando do recebimento de suas primeiras mensagens. Vejamos, rapidamente, a partir do volume “Comentários”, um breve panorama desse colóquio entre dois dos maiores nomes do espiritualismo moderno de origem italiana.
A primeira troca de correspondências entre ambos se dá em 1932, logo em seguida ao recebimento de duas das chamadas Grandes Mensagens que marcam o início da Obra Ubaldiana, a Mensagem do Natal (Dezembro de 1931) e a da Ressurreição (Abril de 1932). Bozzano responde a uma consulta de Ubaldi sobre as mesmas em 1o. de junho do mesmo ano, nos seguintes termos:
"a mensagem recebida por sua mediunidade é indubitavelmente de origem transcendental, e mais ainda, de elevadíssima inspiração. Provem, patentemente, de um grande Mestre espiritual [.....]. Observo que a forma de sua mediunidade — que consiste numa voz subjetiva que lhe dita a mensagem — é idêntica à de Miss Cummins, a médium por meio de quem se manifesta a famosa e extraordinária personalidade espiritual de Patience Worth. Termino encorajando-o a preserverar em suas experiências, das quais espero algo de análogo aos Spirit Teachings, de Moses".
Eis que pouco depois, a 2 de agosto de 1932, Ubaldi recebe a mais altaneira, maior e talvez a mais importante dessa série inicial de mensagens, a “Mensagem do Perdão”, que rapidamente se espalha pelo mundo causando assombro e admiração, e que novamente é objeto de consulta do Prof. Ubaldi a Bozzano. A resposta é pública e realmente especial, foi publicada na Revista Constancia, a 3 de novembro daquele mesmo ano, conforme abaixo:
A PROPÓSITO DA "MENSAGEM DO PERDÃO" DO PROF. PIETRO UBALDI
Da Revista Constancia - Buenos Aires, ano LV, nº 2368, 3 de novembro de 1932.
Senhor Prof. Dr. Pietro Ubaldi
Querido Ubaldi,
Pede-me você um julgamento sobre a "Mensagem do Perdão". Ei-lo em poucas palavras: "Estupendo! Contém passagens tão sublimes em sua cósmica grandiosidade, que infundem quase uma sensação de terror sagrado".
Pergunta-me também se, pelo texto, será possível identificar a Entidade comunicante. Parece-me que dela transparece claramente quem é que se manifesta: "Deus, perdoa-os, não sabem o que fazem" (.....). "Por vós me deixaria crucificar outra vez"(....). "Não queirais renovarme as angústias do Getsêmani" (.....). Infere-se que deve tratar-se nada menos que de Jesus Nazareno. E, do ponto de vista da investigação científica, isto constitui o ponto crítico das mensagens desta natureza, dessas que deixam perplexo o ânimo do leitor, porque se revestem de sublimidade semelhante às que você recebeu; se se trata de investigadores que, como eu, já estão convencidos experimentalmente da verdade irrefutável das comunicações mediúnicas com entidades de desencarnados, poderão convencer-se com facilidade da veracidade da fonte donde emanam as mensagens; todavia, isto ocorrerá sempre por força de um "ato de fé", embora neste caso esta se baseie na experiência adquirida nas investigações mediúnicas.
Infelizmente, todavia, se se deseja convencer o mundo, e mormente os homens de ciência, a respeito do importantíssimo fato da existência e da sobrevivência do espírito humano, fazem falta fatos, induções e deduções de fatos. Foi a este último sistema de investigação positiva sobre o mistério do ser, que eu me dediquei invariavelmente. Isto não impede, no entanto, que esse sistema possa aperfeiçoar-se e completar-se, com o acréscimo dos ensinamentos e da luz espiritual que podem trazer-nos mensagens mediúnicas de tão grande elevação que se impõem à razão. E este, precisamente, o caso das mensagens recebidas por você.
Você me pede um conselho sobre se deve continuar ou ao invés suspender o exercício de sua mediunidade, orientada nesse sentido. Respondo: Cada um tem sua própria missão. A minha era o de contribuir, na medida das minhas forças, para convencer os homens de ciência, com base nos fatos; a sua, parece ser a de trazer à humanidade pensante mensagens elevadíssimas, de ordem moral e espiritual, e que estão destinadas a tornar-se um dia, as únicas importantes para a evolução espiritual dos povos. Prossiga, portanto, em sua missão.
Afetuosas saudações,
Savona, 14 de Outubro de 1932
(a)E. Bozzano
Quase simultâneamente nasce “A Grande Síntese”, cujas primeiras páginas foram recebidas por Ubaldi exatamente naquele mesmo verão de 1932. Publicadas na revista Ali dei Pensiero, a partir de janeiro de 1933, logo o prof. Bozzano compartilha com seu colega da Úmbria as suas primeiras impressões sobre a magnífica obra:
"o conteúdo de A Grande Síntese já aparece e promete tornar-se grandioso, de vez que está de pleno acordo com tudo quanto ensina ou intui a ciência humana"; e ultimamente: (.....) "está concebida em termos rigorosamente científicos e está perfeitamente concorde com as hodiernas concepções filosóficas, matemáticas, geométricas, a respeito do mesmo assunto (.......). Esperando reler e comentar à altura a poderosa mensagem transcendental, quando se tiver a possibilidade de fazê-lo com a obra terminada"
Redigida ao longo dos verões de 32 a 35, e publicada finalmente em volume apenas em 1937, ao longo desse tempo Bozzano fez ainda mais alguns comentários sobre essa poderosa síntese, ainda com o trabalho em andamento:
"a onda supernormal inspiradora foi a que lhe ditou a mais extraordinária, concreta e grandiosa mensagem mediúnica, de ordem científica que se conhece na casuística metapsíquica".(Fevereiro de 1935)
“eu soubera com que admirável constância e a custa de quanto sacrifício e dispersão de energias físico-psíquicas, conseguira sua nobre finalidade. Não se lamente, pois realizou obra meritória, cujo valor científico, filosófico, metapsíquico aumentará com o passar do tempo... Mas A Grande Síntese é tão densa de pensamento, de ciência e de sabedoria, que não é possível pronunciar a respeito um julgamento sumário, enquanto não for publicada em volume". (Outubro de 1935)
A prometida apreciação final, global, só veio portanto em Outubro de 1937, pouco depois da publicação da primeira edição de “A Grande Síntese” pela Editora Hoepli, de Milão, nos termos abaixo:
A PROPÓSITO DE “A GRANDE SÍNTESE”
Querido Ubaldi
Você deseja um parecer global sobre A Grande Síntese. Tarefa difícil, porque se trata de uma obra demasiado densa de pensamento e demasiado variada em seus temas, para que se possa sintetizá-la num parágrafo global.
Apesar de tudo, eis o parágrafo:
Pedem-me um parecer confidencial sobre A Grande Síntese de Pietro Ubaldi. Respondo: Sumamente favorável sob todos os aspectos. Trata-se, realmente, de uma grande Síntese de todo o saber humano, considerado do ponto de vista positivamente transcendental, em que se estudam todos os ramos do saber, sendo esclarecidos e resolvidos numerosos problemas até hoje insolúveis, com o acréscimo de novas orientações científicas, além de considerações filosóficas, científicas, religiosas, morais e sociais, a tal ponto elevadas que induzem a reverente assombro. É uma obra que fará época na história das revelações mediúnicas, tanto mais que esta é a primeira vez que é ditado à humanidade um grande Tratado realmente original, de ordem rigorosamente científica.
Cordiais saudações,
Savona, 12 de Outubro de 1937
(a)Ernesto Bozzano "
O último período de vida de Bozzano foi muito difícil, devido a problemas econômicos e de saúde. Morreu aos 81 anos, em 24 de junho de 1943. Ubaldi veio morar no Brasil em dezembro de 1952 e aqui fez os últimos 20 anos de sua trajetória, desenvolvendo a parte brasileira de sua Obra. Faleceu em S. Vicente, São Paulo, a 29 de fevereiro de 1972, há exatos 50 anos, portanto. Dois grandes gênios do espiritualismo moderno, Ubaldi e Bozzano assinalaram com suas obras e com suas vidas, e em colaboração constante, os fundamentos da Era do Espírito, da Nova Civilização do 3o. Milênio. Deus os abençoe sempre, e que saibamos aproveitar, na melhor medida, o conteúdo de suas obras. Paz e Bem!
E OS GIGANTES VIERAM...
Há alguns anos atrás fizemos um estudo sobre a correlação entre as obras de Chico Xavier e Pietro Ubaldi, que começava com algumas das impressionantes previsões de Léon Denis, sobre a vinda desses dois gigantes da espiritualidade, em sua obra "O Grande Enigma", do qual reproduzimos abaixo algumas das passagens mais diretamente relacionadas a esses dois personagens:
"O abuso dos métodos e dos processos de análise tem estado a ponto de nos perder. Conseqüentemente, é mister preparar as grandes sínteses, as concepções de conjunto. [...] Prepara-se, entretanto, o trabalho de renovação. O século XIX e o começo do XX viram aparecer os precursores. Os gênios não tardarão em vir".
A sensibilidade do mais filosófico dos quatro grandes discípulos de Kardec foi certeira... Os gênios efetivamente vieram. Um no Velho Mundo, no hemisfério norte, do coração da Europa, da abençoada Úmbria franciscana - o prof. Pietro Ubaldi -; o outro, no chamado Novo Mundo, no hemisfério sul, nas Américas, no coração do Brasil, nas gerais, o maior brasileiro de todos os tempos - Francisco Cândido Xavier, doutor em bondade.
Dois gênios da espiritualidade, ou da inteligência espiritual, comparáveis a outros gigantes de outros tempos, como os profetas de Israel, como os apóstolos do Cristo e tantos e tantos nomes venerandos da história espiritual dos povos.
Vieram com missões específicas, determinadas.
A do prof. Pietro Ubaldi foi assinalada 20 anos antes de sua encarnação na obra "Os Quatro Evangelhos", recebida por uma das grandes médiuns da Codificação Kardequiana, Émilie Collignon, primeiro bem definindo o papel de Pedro, o Apóstolo, como pedra fundamental da Igreja do Cristo...
"Pedro preside ao progredir da fé, ao desenvolvimento da inteligência, ao cumprimento das promessas de Jesus. Ele continuou no desempenho da sua missão espiritual, depois de haver cumprido a sua missão humana. Desempenhando esta, começou, com o auxílio dos outros Apóstolos e dos discípulos que se lhes associaram, a construir a Igreja do Cristo. Pelo desempenho da sua missão espiritual, prossegue na execução desta obra e a concluirá. (Tomo II, item 184)
... e depois antecipando sua volta, no Prefácio da mesma obra ("Os Quatro Evangelhos")
"Fica sabendo e faze saber a teus irmãos que a obra que lhes colocas sob as vistas é uma obra preparatória, ainda incompleta, uma entrada em matéria; que não passa de um prefácio da que sairá das mãos daquele que o Mestre enviará para esclarecer as inteligências e despojar INTEIRAMENTE da letra o espírito. Aquele que há de desenvolvê-la e cuja obra também será reparatória não tardará a se dar a conhecer, porquanto a atual geração humana verá os seus primeiros anos messiânicos. E os messias, isto é, os enviados especiais se sucederão até que a luz reine sobre todos". (“Os Quatro Evangelhos”, Prefácio)
Vinte anos mais tarde, a 18 de agosto de 1886, volta à Terra o abençoado apóstolo do Cristo, na personalidade de Pietro Ubaldi, com a missão de dar prosseguimento ao trabalho da renovação planetária prometida pelo Cristo com o advento do Consolador, do Espírito da Verdade, da Terceira Revelação, da volta do Cristianismo do Cristo, produzindo, em exatos 40 anos de trabalho, uma das mais impressionantes e magistrais obras já produzidas pela humanidade, em todos os tempos, reunindo de maneira realmente genial ciência, filosofia e religião, e trazendo novamente ao mundo a Sua Voz, a voz do Cristo, com toda autoridade, profundidade e bondade que a caracterizam.
Mas, pouco depois, a 2 de abril de 1910, na pequenina e pacata cidade de Pedro Leopoldo, no coração das gerais, chegava ao mundo o outro gênio dessa dupla abençoada, uma mais maiores antenas psíquicas da humanidade, de todos os tempos, como também outro Cristão, com "C" maiúsculo mesmo, capaz de nos ensinar vez por todas o que é verdadeiramente a prática do Espiritismo Cristão, em todas as suas facetas, como verdadeiro Homem de Bem - Francisco Cândido Xavier - o nosso Chico, ou o "Cisco de Deus", como ele mesmo gostava de se apresentar, esse incansável operário do Bem, que deixou de legado à humanidade uma das mais vultosas e impressionantes obras de espiritualidade já vistas em nosso planeta, um monumento grandioso e eloquente de saudação à vida eterna, sem começo nem fim, e à comunicação entre os mundos visível e invisível. Foi a intuição popular que o apontou como o maior brasileiro de todos os tempos, e acertou também em cheio, porque definiu bem esse verdadeiro biotipo do futuro, com capacidades psíquicas e qualidades humanas que se encontram muito à frente de nossos dias.
Pois bem, quis a vida que esses dois grandes gênios se encontrassem de novo, curiosamente, nas contas do calendário.
O dia 29 de junho é dedicado à memória de "São Pedro".
O dia 30 do mesmo mês, desde junho de 2002, será a partir de então, e para sempre, e cada vez mais, a data de lembrança e saudação da memória de Chico Xavier, posto que voltou à espiritualidade, depois de 92 anos muitíssimos bem vividos, exatamente neste dia, em 2002.
Sim, Denis estava certo. Os grandes Gênios não tardavam a vir, vieram, deixaram conosco através de suas obras joias de altíssimo valor, verdadeiros patrimônios da humanidade, ao mesmo tempo que uma imensa saudade, posto que ainda por muito tempo será raro de ver, em nosso mundo, tantas capacidades combinadas com tanta bondade, com tanta generosidade.
Deus os abençoe. Devem estar próximos, seguindo hoje e sempre ao Cristo, cujas pegadas perseguem, e que tão bem souberam representar. Deus os abençoe, hoje e sempre!
KARDEC E PIETRO UBALDI
Nossa Doutrina é eminentemente progressiva, conforme preconizado amplamente pelo seu Codificador, Allan Kardec. Temos em nosso DNA uma aversão natural à ortodoxia, ao congelamento do pensamento em função das tradições que desconsideram a lei natural do progresso.
Nossos valores, no entanto, são eternos, posto que fincados na solidez rochosa dos princípios cristãos. Precisam apenas ser lembrados, continuamente, às novas gerações de espíritas, para que sua chama nunca se apague.
Dentre esses valores, dois parecem-nos de extrema atualidade, nesse tempo de "patrulhas ideológicas" e debates acalorados:
a) LIBERDADE DE CONSCIÊNCIA - o espírita sabe que deve respeitar, por princípio, todas as formas de pensamento, mesmo as que lhe contraditam as ideias e o modo de ser, como decorrência natural do "fazer ao próximo o que gostarias que lhe fizessem";
b) MODERAÇÃO - o segundo, tão complementar ao primeiro que lhe serve de perfeito contraponto, como a outra face da mesma moeda, salienta a importância da boa fundamentação de suas próprias opiniões, por parte dos espíritas, para que por esse modo de façam respeitar em qualquer debate, marcadamente pela seriedade, sobriedade e consistência de suas manifestações.
"Seja o vosso falar sim, sim, não, não" - ensinou-nos o Cristo (Mt. 5:37).
Kardec reitera essas recomendações e dá delas o exemplo ao longo de toda a sua trajetória e em todos os seus textos, tanto na Codificação quanto na Revista Espírita:
"Respeitamos vossa opinião, respeitai a nossa. Eis tudo quanto vos pedimos". ("Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas - Allan Kardec - Introdução)
"Já vos disse, senhor, não tenho a pretensão de vos fazer adotar a minha opinião; respeito a vossa, se é sincera, como desejo que respeiteis a minha". (O que é o Espiritismo - Allan Kardec, – O Crítico, pág. 53 da 37a ed. FEB)
"Àquele que nos procura como irmão, nós o acolhemos como tal; ao que nos repele, deixamo-lo em paz. [...] O Espiritismo não se impõe, porque, como vo-lo disse — respeita a liberdade de consciência; [...] Ele expõe seus princípios aos olhos de todos, de modo a cada um poder formar opinião segura. (O que é o Espiritismo - Allan Kardec, – O Padre, pág. 124 da 37a ed. FEB)
“Julgar o que não se conhece é falta de lógica" (Revista Espírita, 1858, Fev - Pág.100 da Ed. FEB)
“Imprudente é se inscreverem em falso contra as coisas que não compreendem”. (Revista Espírita, 1858, Out - Pág. 420 da Ed. FEB)
"E de lógica elementar que o crítico conheça, não superficialmente, mas, a fundo, aquilo de que fala, sem o que, sua opinião não tem valor". (O que é o Espiritismo - Allan Kardec, – O Crítico, pág. 55 da 37a ed. FEB)
Ocorre-nos a lembrança desses pontos a propósito de uma publicação recente do confrade Rafael Van Erven Ludolf, do valoroso Grupo Espírita Servidores de Jesus, de Niterói, trazendo para as redes sociais um texto magnifíco, de autoria do nosso inesquecível CARLOS TORRES PASTORINO (vide sua biografia em nossa página Sal da Terra), um dos maiores estudiosos dos Evangelhos que este país já teve e que serve até hoje de prefácio para o volume "O Sistema", de Pietro Ubaldi.
O texto de Pastorino é um exemplo perfeito do cuidado que devemos ter com a emissão de nossas opiniões, e do valor crescente que elas terão, a qualquer tempo, quando bem fundamentadas, consolidadas através de um estudo sério e prolongado sobre o que se pretende comentar.
Segue abaixo, portanto, reproduzido integralmente, e cremos que dispensa comentários adicionais, de nossa parte, pela elegância, clareza e firmeza com que demonstra, tão bem, a relação de continuidade e complementariedade existente entre as obras de Kardec e Ubaldi, tão conhecidas daqueles que as estudam longa e sistematicamente.
Aos nossos amigos do Servidores de Jesus, a nossa gratidão, pela lembrança de tão genuíno exemplo destes dois valores, que nos são tão caros, e que não podemos perder...
IMPRESSÃO
Terminada a tradução da obra, O Sistema, de Pietro Ubaldi, feita
com a alegria imensa do garimpeiro que vai descobrindo em cada nova linha uma pepita de ouro do
mais puro, não me contenho em rascunhar a impressão que me ficou dessa leitura meditada, do
estudo dessa revelação nova trazida a nós em plena segunda metade do século XX.
Desde a infância, o estudo desses problemas, através das obras
da Teologia Católica, primeiramente, e mais tarde através das publicações oficiais do Espiritismo, do
Protestantismo, da Teosofia, do Esoterismo, da Antroposofia, dos Rosa-Cruzes, das obras mais
antigas da Índia, do Egito e da China, o estudo de tudo isto deu-me uma impressão de incerteza e de
tateamento, ou então de afirmativas sem bases no campo racional. Não há, em todas essas
doutrinas, respeitabilíssimas sem dúvida, porque representam o labor da mente concreta que busca
o conhecimento através de suas próprias forças – não há uma unidade completa que una tudo numa
única visão de conjunto.
Por isso, através da leitura estudada e meditada da obra de Ubaldi, cheguei à conclusão de que o universo é de fato um todo único, cujo centro é Deus. E, completando a maravilhosa e inspirada A Grande Síntese com o volume Deus e Universo, vislumbrei certos aspectos novos. No entanto, o segundo volume citado está demais conciso e alto, não me permitindo à parca inteligência, a compreensão total da grandiosidade ali exposta. Neste volume, entretanto, a explicação é cabal e acessível a todas as inteligências, mesmo as medianas, como a de quem está escrevendo, e as provas são de tal forma completas e irrespondíveis, que pouco haverá que acrescentar a isso, nessa época. Talvez mais tarde se possa dizer algo mais. Mas, no momento, não vemos o que acrescentar ao que aqui se encontra.
O Sistema é um livro ótimo, lógico e claro. Trata-se, em minha
insignificante opinião, de completo curso ou tratado de Teologia cosmogônica, uma Teologia Nova,
que vem cortar pela raiz todas as elucubrações puramente humanas, esclarecendo os pontos
obscuros, revelando todos os mistérios incompreensíveis e inaceitáveis à mente hodierna. As
teologias antigas, que pararam no tempo e no espaço, por se terem tornado dogmáticas e não mais
admitirem pesquisas, reagirão, sem dúvida, a esta intromissão em seu terreno. Mas a humanidade
está em evolução perene, e não seria compreensível que a parte mais nobre e elevada da
humanidade, que é o pensamento e a sabedoria, parassem nos séculos remotos, enquanto a parte
inferior, material, estivesse, como está, progredindo a passos gigantescos.
Neste Tratado Teológico, encontramos um Deus perfeitamente aceitável por Sua grandeza, ao invés daquele Deus mesquinho que trazia sempre bombons na mão direita para premiar e um chicote na esquerda para castigar, como qualquer capataz irritadiço e vulgar. Revela-nos uma finalidade à existência, ao invés de um paraíso de ociosidade inútil e egoísta, em que as criaturas ficarão por toda a eternidade gozando ao ver seus entes queridos sofrendo horrorosamente um inferno infindável.
A teoria da queda e da reabilitação dos espíritos é tão lógica que temos a impressão que ela guiará o mundo espiritualizado de amanhã, esclarecendo os pontos obscuros e dando direção à evolução da humanidade, que hoje se debate em problemas sem solução. É um Tratado de Teologia nova e ao mesmo tempo um Tratado de Filosofia Universalista Unitária, que nos apresenta, como um todo único, um só corpo cuja cabeça é Cristo. A segurança de raciocínio jamais abandona o autor a especulações vazias, mas o leva a provas sólidas, em matéria difícil e complexa. É a única teoria que conhecemos, que pode satisfazer o intelecto, a razão e mesmo o coração, porque explica logicamente tudo o que se passa neste mundo. Filosofia, física, química, biologia, sociologia, moral, tudo é examinado conscienciosamente, com minúcias que esgotam o assunto, com inflexibilidade irrespondível, com segurança e acerto.
A parte mais alta do livro O Sistema é constituída pelo capítulo XX, quando o autor nos dá a terceira interpretação da visão. Esta é de uma clareza deslumbrante. Inegavelmente trata-se, nesta obra, de uma revelação descida do Alto, que nos vem trazer luz acerca de problemas que a mente humana, por si só não poderia resolver.
Perguntam-me alguns confrades, como posso aceitar a teoria de Pietro Ubaldi, sendo, como sou, espírita adepto de Allan Kardec. Confesso não ver nenhuma contradição entre as duas teorias.
Para quem lê Kardec superficialmente, detendo-se nas palavras
impressas, a teoria de Pietro Ubaldi pode parecer "herética". Mas aos que lêem o mestre penetrando
as entrelinhas das respostas dos espíritos, tão sábias e profundas, nada lhes parece de
contráditório.
Em primeiro lugar, Allan Kardec tentou penetrar nesse terreno. Todavia os espíritos não lhe deram a resposta ansiada. Podemos encontrar no Livro dos Espíritos a pergunta 39: "Podemos conhecer o modo de formação dos mundos"? E a resposta dos espíritos: "Tudo o que a esse respeito se pode dizer e podeis compreender é que os mundos se formam pela condensação da matéria disseminada no espaço". Não é o que diz Pietro Ubaldi, no capítulo XX? A origem dos universos foi uma "contração", em que o espírito ficou aprisionado dentro da matéria.
Em segundo lugar, o próprio Kardec afirma não ter dito a última palavra, mas apenas a primeira. E que todas as teorias por ele trazidas deveriam ser desenvolvidas à proporção que a ciência progredisse.
Em terceiro lugar, Allan Kardec preocupa-se com o problema da evolução, a partir da matéria primitiva, sem cogitar do que havia ocorrido antes. Ou seja, começa do mesmo modo em que a Bíblia e do mesmo ponto em que A Grande Síntese iniciaram o estudo: a subida evolutiva dos seres encarnados. Evidentemente, partiram todos da "matéria", ou seja, dos átomos, cuja concentração formou os universos. Nesse ponto – o infinito negativo, o ponto de chegada da involução, a concentração máxima do espírito – era evidente que "todos os espíritos eram simples e ignorantes" (pergunta 115). Entretanto, é evidente a confusão da palavra "espírito", no sentido de "princípio espiritual" com o sentido de espírito humano. Mas as próprias respostas dos espíritos e Allan Kardec classificam a origem, pesquisada agora por Pietro Ubaldi, como "mistério": "a origem deles é mistério" (Pergunta 81). E pouco antes: "Quanto ao modo pelo qual nos criou e em que momento o fez, nada sabemos" (Pergunta 78).
Dentro do próprio Livro dos Espíritos, contudo, encontramos em esboço muito rápido e leves pinceladas, a confirmação da teoria ubaldiana. Pergunta Kardec: "Donde vieram para a Terra os seres vivos"? Resposta: "A Terra lhes continha os germes, que aguardavam momento favorável para se desenvolverem. Os princípios orgânicos se congregaram (teoria das "unidades coletivas"), desde que cessou a atuação da força que os mantinha afastados" (Pergunta 44). Não é o que diz Pietro Ubaldi?
Mas, acima de tudo, está de pé a resposta à pergunta 540, no fim: "É assim que tudo serve, tudo se encadeia na natureza, desde o átomo primitivo até o arcanjo, que também começou por ser átomo. Admirável lei de harmonia, que vosso acanhado espírito ainda não pode apreender em seu conjunto!"
Nada mais cremos seja precioso para provar que a teoria exposta por Pietro Ubaldi, em sua revelação, nada tem de contraditório com a doutrina codificada por Allan Kardec. Antes, vem completá-la e explicá-la, levantando o véu daquele mistério que, há um século, os espíritos julgaram oportuno deixar ainda envolvendo a origem da vida. E isto porque os homens daquela época "ainda não podiam entender" essa origem, pois a ciência não havia demonstrado que matéria é apenas a condensação da energia, e esta a descida das vibrações do espírito. A frase final da resposta à pergunta nº 83 nos revela bem que Allan Kardec, incontestável mestre codificador, não pôde receber dos espíritos uma doutrina completa, porque o ambiente terrestre ainda não estava preparado. Lemos aí: "É tudo o que podemos, por agora, dizer". Então, há mais coisas a dizer, mas não podiam ser ditas, tal como ocorreu quando Jesus disse a seus apóstolos: "Muitas coisas vos tenho a dizer, mas não as podeis suportar agora" (João, 16:12). Por que então condenaremos a teoria de Pietro Ubaldi, se ela sem contradizer nem Kardec, nem Jesus, vem trazer-nos luz a respeito de coisas que nem um nem outro nas haviam revelado? O fato concreto, sob nossa vista, é que a teoria exposta mediante revelação e inspiração por Pietro Ubaldi satisfaz integralmente a todas as indagações científicas, psíquicas, filosóficas, teológicas e espirituais que possamos fazer-nos. Assim sendo, temos que lealmente aceitá-la, até prova em contrário; mas prova que traga argumentos e fatos, experimentações e demonstrações, e não apenas citações do "magister dixit". Hoje o método científico tem de prevalecer para satisfazer tanto à mente concreta quanto à abstrata, tanto à razão quanto à intuição, tanto à inteligência quanto à sensibilidade.
A obra é de suma importância e finca no mundo um marco que dificilmente será removido. Poderá ser mais bem explicado e desenvolvido seu ponto de vista, poderá mesmo ser modificado em seus aspectos secundários. Mas o âmago do problema foi equacionado brilhantemente, e daí poderemos partir para posteriores e maiores pesquisas e buscas. Compete agora ao homem de amanhã essa parte. Mas este já encontrará uma base onde se apoiar, um alicerce sobre o qual poderá erguer novos edifícios. E era isto, justamente, o que faltava à humanidade de hoje, que nada podia edificar em terrenos movediços de mistérios, sobre abismos sem fundo de desconhecimentos confessados. Tudo, dentro da relatividade humana, foi explicado em termos científicos e lógicos. Foi-nos mostrado, com dificuldade por causa da pobreza da linguagem humana, o que a mente do homem perquiria há milênios, e que nos fora dito várias vezes, mas sempre com palavras ocultas, cheias de subentendimentos, que a mente comum não conseguia penetrar.
Para a filosofia e a teologia, este volume constitui um dos mais importantes tratados que já apareceram publicados na face da Terra. É uma luz nova que se levanta no horizonte, um novo sol que vem iluminar as mentes e aquecer os corações, sequiosos de sabedoria e de amor. Porque nele se revelam, em Sua plenitude infinita, a Sabedoria e o Amor de Deus, como centro de tudo, como Seu pensamento a constituir atmosfera psíquica "em que vivemos, nos movemos e existimos (…) porque Dele também somos gerados" (Atos, 17:28)
Carlos Torres Pastorino - Rio, 5 de Julho de 1957
MONTEIRO LOBATO E A GRANDE SÍNTESE
Carta de Monteiro Lobato a Anísio Teixeira
São Paulo, 3 de junho de 1944
Anísio,
Passou por aqui um engenheiro baiano, Nery, que muito me falou de você, e também um moço da livraria do Otales, que te levou meu abraço. Mas esta não é para nada disto – nem para comentar a entrada americana em Roma, o grande fato do dia de hoje. É para te comunicar algo muito mais importante.
Todos nós, Anísio, temos o vago sonho de encontrar um livro que nos seja como uma casa definitiva – a casa de sonho que procuramos. Um livro no qual moremos, ou passemos a morar como um rato dentro de um queijo. Um livro que seja casa e comida. E, como D. João saltava duma mulher para outra em busca da única, ou da certa, nós vivemos como gafanhotos, a pular de livro em livro, é que nunca encontramos o nosso livro. Quando Santo Agostinho dizia temer o homem de um só livro, ele se referia ao perigo que é o homem que encontra o seu livro.
Pois creio que encontrei o Meu Livro – o queijo para casa e comida do rato velho que sou. E chama-se A Grande Síntese, de Pietro Ubaldi. Foi traduzido por Guillon Ribeiro e publicado pela Federação Espírita Brasileira. Temos de lê-lo de cabo a rabo – começando pelo fim. Estou a vagar no alto mar desse livro e tonto, deslumbrado, maravilhado – e inclinadíssimo a reescrevê-lo, tal a minha certeza de torná-lo três vezes mais claro. Guillon sabe a língua e tem estilo, mas não procura facilitar a compreensão do leitor. Eu procuraria a força da clareza.
Quis mandar-te o livro em vez de apenas indicá-lo, mas não achei nenhum nas livrarias, estão tirando nova edição. Fica ai de alcatéia para fisgar um quando esta saia. E leio-o como estou fazendo: sem pressa nenhuma, com a simpatia aberta como uma flor; leia digerida e traduzidamente, isto é, retraduzindo mentalmente em palavras tuas, ou mais próprias, os períodos que o tradutor obscurece com o seu excesso de bom português. Estou ainda pouco avançado na leitura tanto me deslumbro e paro pelo caminho; e tenho um medo imenso de que com você não se dê a mesma coisa. Mas há de dar-se. Impossível que você não veja o que este livro é. E sabe que A Grande Síntese está cá em casa há quase dois anos, e só agora eu a descobri? Poeirinha morou nela todo esse tempo, e foi essa persistência que me atraiu a atenção. Abria-a ao acaso, comecei a lê-la...e eis-me maravilhado! Eis-me evangelizante! Eis-me a escrever ao Anísio, para que a leia também. Por que ao Anísio e não a outro qualquer? Porque você é a inteligência pura, Anísio, e tenho a certeza de que a tua opinião sobre o livro pode coincidir com a minha – e que glória para mim por tê-la indicado!
Mas se acaso seguires meu conselho e leres A Grande Síntese, não quero que me escreva logo após a leitura – e sim um ano depois; isto é, depois que a leitura amadurecer, como os vinhos.
Adeus. Dê-nos a tremenda notícia de que anda projetando uma daquelas famosas vindas a São Paulo. Venha levantar o ânimo de São Paulo que está “crest fallen” com a tua já tão longa ausência.
Mil abraços do
Lobato.
(O original desta carta encontra-se no Centro de Pesquisa e Documentação da Fundação Getúlio Vargas.)
MENSAGEM DO NATAL - Pietro Ubaldi (Natal de 1931)
No silêncio da Noite Santa, escuta-me. Põe de lado todo o saber e tuas recordações; põe-te de parte e esquece tudo. Abandona-te à minha voz; inerte, vazio, no nada; no mais completo silêncio do espaço e do tempo. Neste vazio, ouve minha voz que te diz - ergue-te e fala: Sou eu.
Exulta pela minha presença: grande bem ela é para ti; grande prêmio que duramente mereceste. É aquele sinal que tanto invocaste deste mundo maior em que vivo e em que tu creste. Não perguntes meu nome; não procures individuar-me. Não poderias; ninguém o poderia. Não tentes uma inútil hipótese. Sabes que sou sempre o mesmo.
Minha voz, que para teus ouvidos é terna, como é amiga para todos os pequeninos que sofrem na sombra, sabe também ser vibrante e tonante, como jamais a sentiste. Não te preocupes; escreve. Minha palavra dirige-se às profundezas da consciência e toca, no mais íntimo, a alma de quem a escuta. Será somente ouvida por quem se tornou capaz de ouvi-la. Para os outros, perder-se-á no vozear imenso da vida. Não importa, porém: ela deve ser dita.
Falo hoje a todos os justos da Terra e os chamo de todas as partes do mundo, a fim de unificarem suas aspirações e preces numa oblata que se eleve ao Céu. Que nenhuma barreira de religião, de nacionalidade ou de raça os divida, porque não está longe o dia em que somente uma será a divisão entre os homens: justos e injustos.
A divisão está no íntimo da consciência e não no vosso aspecto exterior, visível. Todos os que sinceramente querem compreender o compreendem. Cada um, intimamente, se conhece, sem que o próprio vizinho possa percebê-lo.
Minha palavra é universal, mas também é um apelo íntimo, pessoal, a cada um. Muitos a reconhecerão.
Uma grande transformação se aproxima para a vida do mundo. Minha voz é singular; porém, outras se elevarão, muito em breve, sempre mais fortes, fixando-se em todas as partes do mundo, para que o conselho a ninguém falte.
Não temas; escreve e olha. Contempla a trajetória dos acontecimentos humanos: ela se estende pelo futuro. Quem não está preso nas vossas férreas jaulas de espaço e tempo, vê, naturalmente, o futuro. Isso que te exponho à vista, é também coerente segundo vossa lógica humana e, portanto, vos é compreensível.
Os povos, tanto quanto os indivíduos, têm uma responsabilidade nas transformações históricas, que seguem um curso lógico; existe um encadeamento de causas históricas que, se são livres nas premissas, são necessárias nas consequências.
A lei da justiça, aspecto do equilíbrio universal, sob cujo governo tudo se realiza, inclusive em vosso mundo, quer que o equilíbrio seja restaurado e que as culpas e os erros sejam corrigidos pela dor. O que chamais de mal, de injustiça, é a natural e justa reação que neutraliza os efeitos de vossos atos. Tudo é desejado, tudo é merecido, embora não estejais preparados para recordar o "como" e o "quando". De dor está cheio o vosso mundo, porque é um mundo selvagem: lugar de sofrimento e de provas. Mas, não temais a dor, que é a única coisa verdadeiramente grande que possuís. É o instrumento que tendes para a conquista de vossa redenção e de vossa libertação. Bem Aventurados os que sofrem, Cristo vos disse.
O progresso científico, principal fruto de vossa época, ainda avançará no campo material. Está, entretanto, acumulando energias, riquezas, instrumentos para uma nova e grande explosão. Imaginai a que ponto chegará o progresso mecânico, ampliando-se ainda mais, se tanto já conseguiu em poucos anos! Não mais existirão, na verdade, distâncias: os diferentes povos de tal modo se comunicarão que haverá uma sociedade única.
A mente humana, porém, troca de direção de quando em quando, vive ciclos, períodos, e, nessas várias fases, deve defrontar diferentes problemas. O futuro contém não só continuações, mas transformações: consequências de um processo natural de saturação. O vosso progresso científico tende a tornar-se e tornar-se-á tão hipertrófico — porque não contrabalançado por um paralelo progresso moral —, que o equilíbrio não poderá ser mantido nos acontecimentos históricos. Tem crescido e, sem precedentes na história, crescerá cada vez mais o domínio humano sobre as forças da natureza. Um imenso poder terá o homem, mas ele para isso não está preparado moralmente, porque a vossa psicologia infelizmente é, em substância, a mesma da tenebrosa Idade Média. É um poder demasiadamente grande e novo para vossas mãos inexperientes.
O homem será dominado por uma tão alargada sensação de orgulho e de força, que se trairá. A desproporção entre o vosso poder e a altura ética de vossa vida far-se-á cada dia mais acentuada, porque cada dia que passa é irresistivelmente para vós, que vos lançastes nessa direção, um dia de progresso material.
As ideias são lançadas no tempo com massa que lhes é própria, como os bólidos no espaço. Eu percebo um aumentar de tensão, lento porém constante, que preludia o inevitável explodir do raio. Essa explosão é a última consequência, mesmo de acordo com a vossa lógica, de todo o movimento. Desproporção e desequilíbrio não podem durar; a Lei quer que se resolvam num novo equilíbrio. Assim como a última molécula de gelo faz desmoronar o iceberg gigantesco, assim também de uma centelha qualquer surgirá o incêndio. Antigamente os cataclismos históricos, por viverem isolados os povos, podiam manter-se circunscritos; agora não. Muitos que estão nascendo, vê-lo-ão.
A destruição, porém, é necessária. Haverá destruição somente do que é forma, incrustação, cristalização de tudo o que deve desaparecer, para que permaneça apenas a ideia que sintetiza o valor das coisas. Um grande batismo de dor é necessário, a fim de que a humanidade recupere o equilíbrio livremente violado: grande mal, condição de um bem maior.
Depois disso a humanidade, purificada, mais leve, mais selecionada por haver perdido seus piores elementos, reunir-se-á em torno dos desconhecidos que hoje sofrem e semeiam em silêncio, retomando, renovada, o caminho da ascensão. Uma nova era começará; o espírito terá o domínio e não mais a matéria, que será reduzida ao cativeiro. Então, aprendereis a ver-nos e a escutar-nos; desceremos em multidão e conhecereis a Verdade.
Basta por agora; vai e repousa. Voltarei; porém recorda que minha palavra é feita de bondade e somente um objetivo de bondade pode atrair-me. Onde existir apenas a curiosidade, desejo de emoção, leviandade ou ainda céptica pesquisa científica, aí não estarei. Somente a bondade, o amor, a dor, me atraem.
Eu presido ao progresso espiritual do vosso planeta e para o progresso espiritual um ato de bondade tem mais valor que uma descoberta científica. Não invoqueis a prova do prodígio, quando podeis possuir a da razão e da fé. É vossa baixeza que vos leva a admirar como sinal de verdade e poder, a exceção que viola a ordem divina. Se isso pode assombrar-vos e convencer-vos, a vós, anarquistas e rebeldes, para nós, no Alto, ela constitui a mais estridente e ofensiva dissonância; é a mais repugnante violação da ordem suprema em que repousamos e em cuja harmonia vibramos, felizes. Não procureis semelhante prova; reconhecei-a, antes, na qualidade da minha palavra.
A todos digo: Paz!
(Pietro Ubaldi, “Grandes Mensagens”)
MENSAGEM DA RESSURREIÇÃO
Pietro Ubaldi (Páscoa de 1932)
De além do tempo e do espaço chega minha voz. É uma voz universal que fala ao mundo inteiro e verdadeira permanece através dos tempos. A verdade não pode sofrer mudanças se olhada por esta ou aquela nação, se observada por uma raça ou outra, porque a alma humana é sempre a mesma em toda parte, se examinada em sua profundeza.
Venho a vós, na Páscoa, acima de tudo para iluminar e confortar, pois vos achais imersos numa vaga de dores. Crise a denominais e a imaginais crise econômica. Eu, porém, vos digo que se trata de uma crise universal, crise de todos os vossos valores morais, de todas as vossas grandezas. É o desmoronar-se de todo um mundo milenário. Digo-vos que a crise se encontra sobretudo em vossas almas: crise de fé, de orientação, de esperanças. É o vertiginoso momento de grandes mutações.
Trago-vos esperança, orientação, paz. A cada um falo hoje a palavra da verdade e do amor, palavra que não mais conheceis. Quero reconduzir-vos às origens milenárias da fé com o intelecto novo, nascido de vossa ciência. No dia da Ressurreição, repito-vos a palavra da ressurreição, a fim de que possais compreender a dor e ultrapasseis as estreitas fronteiras de vossa vida. Comovido, falo a cada um no sagrado silêncio de sua consciência.
Ó tu que lês, afasta-te, por um momento, dos inúteis ruídos do mundo e escuta! Minha voz não te atingirá através dos sentidos, mas, através desta leitura, senti-la-ás aflorar dentro de ti na linguagem de tua personalidade. Minha voz não chega, como todas as coisas, do exterior, contudo, surgirá em ti, por caminhos desconhecidos, como coisa tua, da divina profundeza que em ti existe e na qual também estou.
O universo é infinito e de longe venho, atraído pela tua dor. Nada me atrai tanto como a dor, porque somente nela o homem é grande, e se purifica e redime, dirigindo-se para destinos mais elevados. É triste serdes assim golpeados, mas, somente sofrendo, podeis compreender a realidade da vida. Exulta, porque este é o esforço da tua ressurreição!
A quem sofre eu digo: “Coragem! És um decaído que na sombra reconquista a grandeza perdida”.
É a justa reação da Lei que livremente transgredistes e que exige o retorno ao equilíbrio; instrumento de ascensão, a dor vos aponta o caminho de que fugistes; impõe-vos reabrirdes vossa alma, fechada pelas alegrias fáceis que infelizmente vos cegam, para que alcanceis júbilos mais altos e verdadeiros. A dor é uma força que vos constrange a refletir e a buscar em vós mesmos a verdade esquecida. É imposição de um novo progresso.
Abraça com alegria esse grande trabalho que te chama a realizações mais amplas. Se não fosse a dor, quem te forçaria a evolver para formas de vida e de felicidade mais completas?
Não te rebeles; pelo contrário, ama a dor. Ela não é uma vingança de Deus e sim o esforço que vos é imposto para mais uma conquista vossa.
Não a amaldiçoes, mas apressa-te a pagar o débito contraído pelo abuso da liberdade que Deus te deu para que fosses consciente. Abençoa essa força salutar que, superando as barreiras humanas, sem distinção transpõe todas as portas, penetra o que é secreto, e fere, e comanda, e dispõe, e por todos se faz compreender. Abraça a dor, ama-a, e ela perderá sua força. Aceita a indispensável escola das ascensões. Se te revoltares, tua força nada conseguirá contra um inimigo invisível e a violência, em retorno, mais impetuosamente cairá sobre ti.
Coragem! Ama, perdoa e ressuscita! Não procures nos outros a origem de tua dor, mas, sim, em ti mesmo, e arrepende-te. Lembra-te de que a dor não é eterna, porém uma prova que dura até que se esgote a causa que a gerou. Tua dor é avaliada e não irá jamais além de tuas forças. O mundo foi criado para a alegria e a alegria lhe voltará. Da outra margem da vida, outras forças velam por ti e te estendem os braços, mais do que tu ansiosas pela tua felicidade.
Falei com o coração ao homem de coração. Falarei agora à inteligência.
Tendes, ó homens, a liberdade de vossas ações, nunca a de suas consequências. Sois senhores de semear alegria ou dor em vosso caminho, e não o sois de alterar a ordem da vida. Podeis abusar, porém, se abusardes, a dor reprimirá o abuso. De cada um de vossos males, fostes vós mesmos que semeastes as causas.
O maior erro de vossos tempos é a ignorância da realidade moral, íntima orientação da personalidade, que é o fundamento da vida social.
O homem moderno se aproxima de seu semelhante para tomar-lhe alguma coisa, nunca para beneficiá-lo. A vossa civilização, que é econômica, está baseado no princípio "do ut des ", que é a psicologia do egoísmo. É a força econômica sempre a reger o mundo. A psicologia coletiva não é senão a soma orgânica dessas psicologias individuais. A riqueza se acumula onde a força a atrai, e não onde a necessidade ou superiores exigências a reclamam; não constitui instrumento de uma vida de justiça e de bem, mas, sim, máquina de poder, representando, em si mesma, um objetivo. A lei de equilíbrio é constantemente violada e impõe reações. Não dominais a riqueza, conduzindo-a a fins mais elevados: é a riqueza que vos domina.
Trabalhai, mas que o escopo do vosso trabalho não se reduza apenas a proveitos isolados e egoístas, e sim a frutificar no organismo social; somente então se formará aquela psicologia coletiva, que é a única base estável da sociedade humana.
Fazei o bem, todavia, lembrai-vos de que o pobre não deseja propriamente o supérfluo de vossas riquezas, mas que desçais até ele, que partilheis de sua dor e, até, que a tomeis para vós, em seu lugar.
Venerai o pobre: ele será o rico de amanhã. Apiedai-vos do rico que amanhã será o pobre. Todas as posições tendem a inverter-se a fim de que o equilíbrio permaneça constante. A riqueza tende para a pobreza e a pobreza para a riqueza. Ai daqueles que gozam! Bem-aventurados os que sofrem! Esta é a Lei.
Não confieis no mundo, que rirá convosco enquanto tiverdes força e bem estar; confiai, antes, em mim, que venho quando sofreis e vos trago auxílio e conforto. Já vedes, hoje, que a dor realmente existe e que nem o ceticismo nem qualquer poder humano conseguem afastá-la.
Uma radical mudança verificar-se-á na sociedade humana, a fim de que a vida não seja um ato de conquista, onde triunfe o mais forte ou o mais astuto, mas, sim, um ato de bondade e de sabedoria em que seja vitorioso o mais justo. Investigando-as com vossa ciência, achareis no íntimo das coisas essa suprema Lei de equilíbrio que vos governa; aprendereis que a bravura da vida não está em violar essa Lei, semeando para vós mesmos reações de dor, porém, em segui-la, semeando efeitos de bem. Deveis também aprender que o vencedor não é o mais forte — esse é um violador — e sim quem segue conscientemente o curso das leis e sem violência se equilibra no seio das forças da vida. As religiões já o revelaram, entretanto, não acreditastes; a ciência o demonstrará, todavia não desejareis ver. O momento é decisivo. Ai de vós se, nesta vitória de civilização material em que viveis, desejardes ainda perseverar no nível do bruto.
Está maduro o mundo, mas, ao mesmo tempo, cansado de tentativas e experiências, do irresolúvel emaranhado de vossos expedientes; cansado de viver no momento, em face de um amanhã repleto de incógnitas; e quer seriamente prever e resolver os grandes problemas da vida, quer francamente olhar o futuro, ainda que isso reclame uma grande coragem.
O mundo tem necessidade da palavra simples e forte da verdade e não de novas astúcias a rolarem por velhos caminhos. O mundo espera essa palavra com ansiedade, como também a aguarda o momento histórico.
A psicologia coletiva tem o pressentimento, embora confuso, de uma grande mudança de direção; sente que o pensamento humano, não mais infantil, apresta-se para tomar as rédeas da vida planetária e que o homem vai substituir o equilíbrio instintivo e cego das leis biológicas por outro equilíbrio, consciente e desejado. Por isso está buscando a luz, para que seu poder não naufrague no caos.
Não está longe de desaparecer vossa psicologia experimental, que será substituída pela psicologia intuitiva; esta a muito longe conduzirá vossa ciência. Novos homens divulgarão a verdade; não mais serão mártires cobertos de sangue, nem se assemelharão aos anacoretas de outrora, porém homens de inteligência e de fé, que difundirão seus pensamentos utilizando-se de moderníssimos recursos, homens que servirão de exemplo no meio do turbilhão de vossa vida.
Despedaçai a férrea jaula que o passado para vós construiu, e onde já não vos resta espaço. Ousai abandonar os velhos caminhos mas não ouseis loucamente, onde não há razão para ousadias; ousai na direção do alto e nunca ousareis demasiadamente. Do grande mar de forças latentes, que não percebeis, imensa vaga levantará o mundo.
Até lá, guardai a fé! A vossa crise, se é profunda e dolorosa, fará, no entanto, nascer o homem novo do terceiro milênio. Para resolvê-la, recordai que ela é mal de substância, que não se debela corrigindo a forma, como procurais fazer. Para solucioná-la é necessário considereis o problema em sua substância; e sua substância é o homem, sua psicologia, sua alma, onde se encontra a motivação de suas ações, a fonte original dos acontecimentos humanos. Eis aí a chave do futuro.
Vosso multimilenário ciclo de civilização está a esgotar-se; deveis retomá-lo em nível mais elevado, vivê-lo mais profundamente, não somente crendo, mas, também, " vendo ".
Ai de vós se, depois de haverdes atingido o domínio do planeta, não dominardes a máquina, a riqueza e as vossas paixões, com um espírito puro. Sois livres e podeis também retroceder. No período que resta deste século se decidirá do terceiro milênio. Ou vencer, ou morrer: e a morte, desta vez, é a morte pior, porque é morte de espírito. A todos eu digo : "Ressuscitai com a minha ressurreição".
(Pietro Ubaldi, “Grandes Mensagens”)
MENSAGEM DO PERDÃO
(Pietro Ubaldi, 2 de agosto de 1932, dia do “Perdão da Porciúncula” de São Francisco)
Filho meu, minha voz não despreza tuas pequeninas coisas de cada dia, mas delas se eleva para as grandes coisas de todos os tempos.
Ama o trabalho, inclusive o trabalho material. Coisa elevada e santa, o trabalho, presentemente, foi transformado em febre. De que não se tem abusado entre vós? Que coisa ainda não foi desvirtuada pelo homem? Em tudo vos excedeis e, por isso, ignorais o labor equilibrado, que tão elevado conteúdo moral encerra: se busca o necessário ao corpo, ao mesmo tempo contenta o espírito. E, no entanto, transformastes esse dom divino, com o qual poderíeis plasmar o mundo à vossa imagem, em tormento insaciável de posse. Substituístes a beleza do ato criador, completo em si mesmo, pela cobiça que nunca descansa. Quantos esforços empregados para envenenar-vos a vida!
Ama o trabalho, mas com espírito novo; ama-o, não pelo que ele é propriamente, porém, como um ato de adoração a Deus, como manifestação de tua alma, nunca como febre de riqueza ou domínio. Não prendas tua alma aos seus resultados, que pertencem à matéria e, portanto, sujeitos à caducidade; ama, porém, o ato, somente o ato de trabalhar. Não seja a posse, o triunfo, a tua recompensa, mas sim, a satisfação íntima de haveres cumprido, cada dia, o teu dever, colaborando assim no funcionamento do grande organismo coletivo.
Esta é a única recompensa verdadeira, indestrutível, solidamente tua; as demais depressa se dissipam e se perdem. Ainda que nenhum resultado positivo obtivesses, uma recompensa ficaria contigo para sempre: a paz do coração, paz que o mundo perdeu por prender-se às coisas concretas, julgando-as seguras.
Desapega-te de tudo, inclusive do fruto de teu trabalho, se queres entrar na posse da paz. Ocupa-te das coisas da Terra, mas apenas o suficiente para aprenderes a desapegar-te delas.
Toda construção deve localizar-se no teu espírito, deve ser construção de qualidades e disposições da personalidade, e não edificação na matéria, que é um remoinho de areia que nenhum sinal pode conservar.
Tudo o que quiserdes vos seja unido eternamente deve ser unido por qualidades e merecimento, deve ser enlaçado pela força sutil da Lei, por vós movimentada, nunca por vossa força exterior, ou por vínculos das convenções sociais ou ainda por liames da matéria. Só nesse sentido se pode realmente possuir: de outro modo, não obtereis senão a tristeza depois da ilusão e a consciência posterior da inutilidade de vossos esforços.
Outro grande problema, que voz diz respeito, é o amor. Elevai-vos em amor, como deveis elevar-vos em todas as coisas, se quereis encontrar profundas alegrias. Martelai vossa alma, num íntimo trabalho de cada dia, que vos leva à conquista de amores sempre mais extensos, únicos que têm a resistência das coisas terrenas.
Sabes que o amor se eleva do humano ao divino e que nessa ascensão ele não se destrói, mas se fortalece, aperfeiçoando e multiplicando-se. Segue-me e, então, poderás entoar o cântico do amor:
“Meu corpo tem fome e eu canto; meu corpo sofre e eu canto; minha vida é deserta e eu canto; não há carícias para mim, porém todas as criaturas vêm à mim. Meu irmão de mim se aproxima como inimigo, para prejudicar-me, e eu lhe abro os braços em sinal de amor. Eu vos bendigo a todos vós que me trazei dor, porque com ela me trazeis a purificação, que me abre as portas do Céu. Minha dor é um cântico que me faz subir. louvado sejas, ó Senhor, pelo que é a maior maravilha da vida; que as pobres intenções malignas de meu próximo sejam para mim a Tua Bênção”.
Estes meus ensinamentos são dirigidos mais à vossa intuição que ao vosso intelecto. Tem um sentido mais amplo o que vos tenho dito: a felicidade dos outros é vossa única felicidade, verdadeira e firme. Significa extinção dos egoísmos num amplexo universal de altruísmo. Tudo isso pode ser de fácil compreensão, mas é difícil senti-lo. Não procuro vossa razão que discute, antes busco essa visão interior que em vós opera, que sente por imediata concepção, que enxerga com absoluta clareza e lealmente se entrega à ação.
Peço-vos o ímpeto que somente nasce do calor da fé e que nunca vem pelos tortuosos caminhos do raciocínio. Não desejo erudição, pesquisas e vitórias do intelecto; quero, antes, que vejais, num ato sintético de fé e que imediatamente vivais vossa visão, e personifiqueis a idéia avistada, e resplendais vós mesmos, em seu esplendor. Somente então a idéia viverá na Terra e personificado em vós existirá um momento da concepção divina.
Não estou apelando para vossos conhecimentos nem para vosso intelecto, que não são patrimônios de todos, mas venho até junto de vós por caminhos inabituais e em vós penetro como um raio que desce às profundezas e dissipa as trevas, que cintila e vos arrasta através de novas vias, com forças novas, que levantarão o mundo como num turbilhão.
Também falarei, para ser entendido, a linguagem fria e cortante da razão e da ciência, porém usarei, acima de tudo, da linguagem ardente e direta da fé. Minha palavra será ora o brado de comando, ora a ternura de um beijo de mãe.
Para ser por todos compreendida, minha palavra percorrerá os extremos de sabedoria e de singeleza, de força e de bondade. Será pranto de amargura e remoinho de paixão; será nostálgico lamento, suspirando por uma grande pátria distante, como será também ímpeto de ação para até ela conduzir-vos. Minha palavra rolará, por vezes, como regato susurrante em verde campina, a trazer-vos o frescor das coisas puras; outras vezes trovejará com os elementos enfurecidos na fúria da tempestade.
Ao seio de cada alma quero descer e adaptar-me a fim de ser compreendido; para cada uma devo encontrar uma palavra que a penetre no mais íntimo, que a abale, que a inflame e a arroje para o alto, onde eu estou, que até junto de mim a conduza, onde eu a espero.
Almas, almas eu peço. para conquistá-las vim das profundezas do infinito, onde não existe espaço nem tempo, vim oferecer-vos meu abraço, vim de novo dizer-vos a palavra da ressurreição, para elevar-vos até mim, para indicar-vos um caminho mais elevado onde encontrareis as alegrias puras.
Vós vos identificastes de tal modo com a vida física que já não podeis sentir senão uma vida limitada como a do vosso corpo. Pobre vida, rápida e cheia de incertezas, enclausurada nas limitações de vossos pobres sentidos. Pobre vida, encerrada num ataúde, na sepultura que é o corpo a que tanto vos agarrais. Minha voz encerrará todos os extremos de vossas diferentes psicologias. Escutai-me!
Não vos ensino a gozar das coisas terrenas, porque são ilusórias; indico-vos as alegrias do céu, porque somente estas são verdadeiras. Minha verdade não é a fácil verdade do mundo; não vos prometo alegrias sem esforços, mas minha promessa não vos ilude. Meu caminho é caminho de dor, porém, eu vos digo que somente ele vos conduzirá à liberação e à redenção. Minha estrada é de luta e de espinhos, mas vos fará ressurgir em mim, que vos saciarei para sempre. Não vos digo: “Gozai , gozai”, como o mundo vos fala. O mundo, porém, vos engana, eu não vos enganaria nunca.
Minha verdade é áspera e nua, contudo é a verdade. Peço o vosso esforço, mas dou a felicidade. Digo-vos: “Sofrei”, mas junto de vós estarei no momento da dor; com piedade maternal, velarei por vós; medindo todo o vosso esforço, proporcionarei as provas segundo vossa capacidade; finalmente, farei o que o mundo não faz: enxugarei vossas lágrimas.
O mundo parece espargir rosas, mas na verdade distribui espinhos; eu vos ofereço espinhos, porém vos ajudarei a colher rosas.
Segui-me, que o exemplo já vos dei. Levantai-vos, ó homens: é chegado o momento. Não venho para trazer guerra, mas, sim, paz. Não venho trazer dissensão às vossas idéias nem às vossas crenças: venho fecundá-las com meu espírito, unificá-las na minha luz.
Não venho para destruir e sim para edificar. O que é inútil morrerá por si mesmo, sem que eu vos dê exemplo de agressividade.
Desejaríeis sempre agredir, até mesmo em nome de Deus. Com que grande avidez ansiais por discussões e lutas contra vossos próprios irmãos, prontos a profanar, assim, minha pura palavra de bondade. Repito-vos: “Amai-vos uns aos outros”. Não discutais, mas dai o exemplo de virtude na dor, amai vosso próximo; aprendei a estar sempre prontos para prestar um auxílio, em qualquer parte onde haja um padecimento a aliviar, uma carícia a oferecer. Vossas eruditas investigações tornaram tão ásperas vossas almas que não vos permitiram avançar um só passo para o Céu.
Não venho para agredir, mas para ajudar; não para dividir, mas unir; não demolir, mas edificar. Minha palavra busca a bondade, antes que a sabedoria. Minha voz a todos se dirige. Ela é ampla como o universo, solene como o infinito. Descerá aos vossos corações, às vezes com a doçura de um carinho, outras vezes arrastadora como o tufão.
***
Do alto e de muito longe venho até vós. Não podeis perceber quão longo é o caminho que nós, puro pensamento, devemos percorrer a fim de superar a imensa distância espiritual que nos separa de vós, imersos na terra lodosa. Vossas distâncias psicológicas são maiores e mais difíceis de serem vencidas que as distâncias de espaço e tempo. Por isso, às vezes, chego fatigado. Minha fadiga, porém, não é cansaço físico: provém apenas do desalento que me nasce de vossa incompreensão. E, no entanto, minha palavra tem a doçura da eternidade e do infinito. Tem a tonalidade tão ampla como jamais possuiu a voz humana: deveríeis, por isso, reconhecer-me.
Venho a vós cheio de amor e de bondade, e me repelis. Eu, que vejo os limites da história de vosso planeta; eu, que num rápido olhar, vejo sem esforço toda a laboriosa ascensão desta humanidade cujo pai sou; eu me faço pequenino hoje, limito-me e me encerro num átimo de vosso momento histórico para que possais compreender-me.
Se vos falasse com minha voz potente, não me entenderíeis. Meu olhar contempla a Terra, quando o homem ainda não a habitava e também a vê no futuro distante, morta, a navegar no espaço como um ataúde de todas as vossas grandezas. Vejo vosso sol moribundo, depois morto e em seguida chamado a uma nova vida. Vejo, além desse átomo que é o vosso planeta, uma poeira de astros a revolutearem sem cessar pelos espaços infinitos, e todos eles transportando consigo humanidades que lutam, sofrem, vencem e se elevam. tudo vejo, tudo leio nos vossos corações como nos corações de todos os seres.
Além do vosso universo físico, vejo um maior universo moral, onde as almas, na sua laboriosa ascensão, cumprindo seu diuturno esforço de purificação para o Alto, cantam o mais glorioso hino à Divindade. Esplendorosa luz existe no centro moral do universo, luz que atrai todos os seres por uma força de gravitação moral mais poderosa do que aquela que mantém associadas no espaço as grandes massas planetárias e estelares. tudo vejo, mas nada falo para não vos perturbar. tudo vejo e minha mão possante firma o destino dos mundos. Poderia mudar o curso dos astros, mas nós somos lei, ordem e equilíbrio e não aprovamos violações. Empunho o destino dos povos e, no entanto, venho humildemente até vós, para entre vós colher o perfume que se desprenda de uma alma simples. Esse é meu único conforto, quando desço ao vosso mundo, às camadas profundas e obscuras de matéria densa, formadas de coisas baixas e repugnantes. Aquele perfume parece perder-se na vossa atmosfera carregada de emanações perniciosas, como que vencido pelas forças envolventes do mal. Eu o percebo, no entanto, elegendo-o, e recolho como se guarda uma jóia humilde e gentil, desabrochada na lama, e a guardo em meu coração, onde ela repousará. É o único carinho que encontro em vosso mundo, o único hino, puro e singelo, que me faz descansar. Como a criancinha repousa aos cânticos de sua mãe, que lhe parecem os mais belos, assim me acalento, invadido por infinita doçura, no seio dessas vozes humildes dispersas em vosso mundo.
Essa é a única trégua em meio ao trabalho de iluminar e guiar-vos, ó homens rebeldes, que acreditais dominar e sois dominados, que pensais subir, mas, na verdade, desceis. Eu poderia, contudo, atemorizar-vos por de prodígios, aterrorizar-vos com cataclismos. Convencer-vos-ia, no entanto? Minha mão se levanta sobre vós, que sois maus, como uma bênção, nunca para vinganças.
Escutai com atenção esta grande palavra: desejo que o equilíbrio, violado pela vossa maldade, se restabeleça pelos caminhos do amor e não pelo castigo. Compreendeis a grande diferença?
Eis as razões da minha intervenção, da minha presença entre vós.
A Lei quer o equilíbrio. É a Lei. Vós a desrespeitastes com vossas culpas, ultrajando assim a Divindade. O equilíbrio "deve" restabelecer-se, a reação "deve" verificar-se, o efeito "deve" acompanhar a causa, por vós livremente buscada.
Deus vos quer livres, já o sabeis. Pois bem, eu venho para que o equilíbrio se restabeleça pelos caminhos do amor e da compreensão; venho para incitar-vos, com palavras de fogo, ao entendimento, estimular-vos a retomar livremente a via da redenção; finalmente, venho ensinar-vos a fazer de vossa liberdade um uso que vos eleve e salve, e não que vos rebaixe e condene. Venho tornar-vos conscientes dessa Lei que vos guia e da maneira de restaurardes a ordem violada, a fim de que essa violação não venha a recair sobre vós, como tremendo choque de retorno que destruirá vossa civilização.
Venho para salvar-vos, para salvar o que de melhor possuís, o que fatigosamente os séculos têm acumulado, ao preço de muitas dores e de muito sangue.
Entre a necessidade férrea da Lei que, inexoravelmente, volve ao equilíbrio, interponho hoje o meu amor e a minha luz, como já interpus a minha dor e o meu martírio!
Homens, tremei! É supremo o momento. É por motivos supremos que do Alto desço até vós. Escutai-me: o mundo será dividido entre aqueles que me compreendem e me seguem e aqueles que não me compreendem e não me seguem. Ai destes últimos! Os primeiros encontrarão asilo seguro em meu coração e serão salvos; sobre os outros a Lei, não mais compensada pelo meu amor, descerá inelutavelmente e eles serão arrastados por um vendaval sem nome para trevas indescritíveis.
Não vos iludais: reconhecei a minha voz. Reconhecei-a pela sua imensa tonalidade, pela sua bondade sem fronteiras. Algum homem, porventura, já falou assim? falo-vos de coisas singelas e elevadas, de coisas boas e terríveis. Sou a síntese de todas as Verdades.
Não me oponhais barreiras de vossas almas, mas escutai, ponderai, deixai que este raio de luz que vem de Deus desça à vossa consciência e a ilumine. Eu vô-lo rogo, humilhando-me em vossa presença; humildemente, para vossa salvação, eu vos suplico: escutai a minha voz!
Que sobre vós desça a paz. A paz! A paz que não mais conheceis venha sobre vossas almas! Entre vós e a divina justiça está minha oração: “Deus, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.
Pobres seres perdidos na escuridão das paixões; pobres seres que tomais por luz verdadeira o ouropel fascinador das coisas falsas da Terra! Pobres seres, maus e perversos! E, no entanto, sois meus filhos e por amor de vós de novo subiria à cruz para vos salvar. Pobres seres que, numa vitória efêmera de matéria, que chamais civilização, haveis perdido completamente o único repouso do coração – a minha paz.
Escutai-me. Falo-vos com amor, imenso amor. Fui por vós insultado e crucificado, e vos perdoei; perdôo-vos ainda e ainda vos amo. Trago-vos a paz. Até junto de vós retorno para falar-vos de uma ciência que a vossa não conhece, para pronunciar-vos a palavra que nenhum homem sabe falar, palavra que vos saciará para sempre. Escutai-me.
Minha voz conduzirá vosso coração a um êxtase que nenhuma vitória material, que nenhuma grandeza do mundo jamais vos poderá dar.
Como um clarão intuitivo, minha luz espargirá sobre vós uma compreensão a que os laboriosos processos de vossa razão não chegarão jamais. A razão, filha do raciocínio, discute e calcula, mas eu sou o clarão que em vós se acende e pode, num átimo, transformar-vos em heróis. Aceitai, suplico-vos, este supremo dom que vos ofereço e pelo qual vim de tão longe até junto de vós: aceitai esta dádiva esplêndida, que é a minha paz. É a bem-aventurança do céu, que vos trago de mãos cheias; é a felicidade que coisa alguma terrena jamais vos poderá dar. Reconhecei a minha paz! Para recebê-la, abri todas as portas de vossa alma! Dela saciai-vos, com ela inebriai-vos! É um dom imenso que vos trago do seio de Deus, é uma graça com que o meu imenso Amor recompensa a vossa ingratidão.
Até vós eu venho, trazendo os mais lindos dons, para derramar sobre vossas almas a verdadeira felicidade. Venho para suavizar a Justiça Divina. Fiz longa e fatigante viagem, do meu Céu radioso às vossas trevas. Vim espontaneamente, pelo amor que vos consagro. Não renoveis as torturas do Getsêmani, as angústias da incompreensão humana, os tormentos de um imenso amor repelido.
Quem sou eu? - perguntais-me.
Sou o calor do sol matinal que vela o desabotoar da florzinha que ninguém vê; sou o equilíbrio que, na variação alternadora dos elementos, a todos garante a vida. Sou o pranto da alma quebrantada, em que desabrocha a primeira visão do divino. Sou o equilíbrio que, nas mudanças dos acontecimentos morais, a todos promete salvação. Sou o rei do mundo físico de vossa ciência; sou o rei do mundo moral que não vedes.
Sempre me procurais, em toda a parte. Sempre mais profundamente vos escapo, de fibra em fibra, nas vossas mesas de anatomia, de molécula em molécula nos vossos laboratórios. Vós me procurais, dilacerando e dissecando a pobre matéria: mas eu sou espírito e animo todas as coisas. Não com os olhos e os instrumentos materiais, mas somente com os olhos e os instrumentos do espírito podereis encontrar-me.
Sou o sorriso da criança e a carícia materna; sou o gemido daquele que corre implorando salvação; sou o calor do primeiro raio de sol da primavera, que traz a vida e sou o vendaval que traz a morte; sou a beleza evanescente do momento que foge; sou a eterna harmonia do universo.
Sou Amor, sou Força, sou Ideia, sou Espírito que tudo vivifica e está sempre presente. Sou a lei que governa o organismo do universo com maravilhoso equilíbrio. Sou a Força irresistível que impulsiona todos os seres para a ascensão. Sou o cântico imenso que a criação entoa ao Criador.
Tudo sou e tudo compreendo, até o mal, porquanto o envolvo e o limito aos fins do bem. Meu dedo escreve, na eternidade e no infinito, a história de miríades de mundos e vidas, traçando o caminho ascensional dos seres que para mim se voltam, seres que atraio com meu Amor e que recolherei na minha luz.
Muitos mundos já vi antes do vosso, muitos verei depois dele. Vossas grandes visões apocalípticas para mim são pequeninas encrespaduras nas dimensões do tempo. Virei, entre raios de tempestade, para dobrar os orgulhosos e elevar os humildes. Virei vitorioso na minha glória e no meu poder, triunfante do mal, que será rechaçado para as trevas.
Tremei, porque quando eu já não for o Amor que perdoa e vos protege, serei o turbilhão que tempestua, serei o desencadear dos elementos sem peias, serei a Lei que, não mais dominada pela minha vontade, trazendo consigo a ruína, inexoravelmente explodirá sobre vós.
Tudo é conexo no universo; causas físicas e efeitos morais, causas morais e efeitos físicos. Um organismo compressor vos envolve e nele estais presos em cada ato vosso.
Minha poderosa mão firma o destino dos mundos e, no entanto, sabe descer até a mais humilde criancinha para lhe suster, carinhosamente, o pranto. Essa é minha verdadeira grandeza.
Ó vós que me admirais, tímidos, no ímpeto da tempestade, admirai-me, antes, no poder que tenho de fazer-me humilde para vós, no saber descer do meu elevado reino à vossa treva; admirai-me nessa força imensa que possuo de constranger meu poder a uma fraqueza que me torna semelhante a vós.
Não vos peço que compreendais meu poder, que me situa longe de vós; rogo-vos que compreendais o meu amor que me assemelha a vós e me coloca ao vosso lado. Meu poder poderá desalentar-vos e atemorizar-vos, dando-vos de mim uma idéia não justa, a de um senhor vingativo e despótico. Não quero vossa obediência por temor. Agora deve despontar uma nova aurora de consciência e de amor. Deveis elevar-vos a uma lei mais alta e eu retorno hoje para anunciar-vos a boa nova. Não sou um senhor vingativo e tirânico, como outrora, por necessidade, me supuseram os povos antigos; sou o vosso amigo e é com palavras de bondade que me dirijo ao vosso coração e à vossa razão.
Não mais deveis temer, mas, sim, compreender. Vossa razão infantil já acordou e nela venho lançar minha luz. Sou síntese de verdade e em toda a parte ela surgirá, atingindo a luz da vossa inteligência.
Não trago combates, mas paz. Não trago divisões de consciência e, sim, união de pensamentos e de espíritos.
A humanidade terrestre aproxima-se de sua unificação, numa nova consciência espiritual. Não vos insulteis, pois; antes, compreendei-vos uns aos outros. Que cada um concorra com o seu grãozinho para a grande fé e que esta vos torne todos irmãos.
Que a religião, que é revelação minha, e a ciência, que é o vosso esforço e todas as vossas intuições pessoais se unam estreitamente numa grande Síntese, e seja esta uma síntese de verdade.
Porque eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida.
(Pietro Ubaldi, “Grandes Mensagens”)
MENSAGEM AOS CRISTÃOS
Pietro Ubaldi
(No XIX Centenário da Morte de Cristo)
Ó Cristãos do mundo inteiro, que tendes feito, em dezenove séculos de
trabalho, pela realização, na Terra, do Reino dos Céus?
Ao lado da criação de uma civilização, da direção milenária dada ao pensamento humano, de obras colossais da arte, de uma multidão de mártires, gênios e santos, ao lado de todo bem que o Cristianismo tem trazido por força da divina centelha que o anima, quanto mal proveniente da fraqueza humana em cujo meio tem operado! Quanta resistência tendes oposto a esse divino impulso que anseia por elevar-nos! Quanta tenacidade vossa para permanecerdes substancialmente pagãos! Quantas tempestades não tem o homem desencadeado, com suas paixões, em torno da nave da Igreja de Roma!
A dura necessidade de comprimir o incoercível pensamento na forma, em regras disciplinares, e de cobrir a verdade resplandecente com um véu de mistério, foi imposto por vosso instinto de rebeldia, que de outro modo teria levado o princípio original a fragmentar-se no caos.
Algumas elevadas verdades que o Cristianismo contém não puderam exercer ação senão por motivo de imaturidade dos homens; certas liberdades não podem ser concedidas àqueles que estão sempre prontos a abusar de tudo.
Que imenso esforço, que longo caminho deve percorrer a idéia divina até poder concretizar-se na Terra!
Nunca vos interrogastes que imensa força moral representaríeis no mundo se fôsseis verdadeiramente cristãos? Nunca a vos mesmos perguntastes que paraíso seria a Terra se houvésseis compreendido e praticado a boa nova do amor evangélico? Em vez disso, que triste espetáculo! A palavra de unidade subdividiu-se, o rebanho está desunido, os filhos de Cristo já não são irmãos, mas inimigos!
É chegada a hora de despertardes á luz de uma consciência maior. O tempo maturou o momento de grandes abalos, inclusive no campo do espírito.
E no momento decisivo eu venho lançar no mundo a idéia decisiva. Venho reunir-vos todos, ó Cristãos do mundo, a fim de que, acima da forma que vos divide, vos aconchegueis em torno da figura de Cristo e encontreis de novo uma unidade substancial.
Isso vos digo em Seu nome, quando se completam dezenove séculos de Sua morte e a história se encaminha para o terceiro milênio. Digo-vos que deveis abraçar-vos novamente em face da ameaça do iminente momento histórico, a fim de que vossa união constitua uma barreira contra o mal, que se prepara para desencadear um tremendo ataque. As grandes lutas exigem grandes unificações.
Não toco em vossas divisões de forma, mas enfatizo a substância da idéia de Cristo, de que todas vossas crenças nasceram. Quero que se vivifique a fé, desfalecente em vossas almas; que se reanime a fé nas coisas eternas, já escritas com tanta simplicidade; que de novo viva o singelo espírito do Evangelho e vos torne todos irmãos. É somente disso que o mundo precisa e essa é a solução para todas as crises. Não são necessários novos sistemas: é preciso que surja o homem novo.
Eu venho para unir, não para dividir; trago paz e não guerra. Não toco em vossas organizações humanas, mas vos digo: Amai-vos em nome do Cristo e vossas organizações se tornarão perfeitas.
Antes do início do novo milênio, todos os valores humanos sofrerão uma grande revisão e a fé se enriquecerá com a contribuição da razão e da ciência.
Na iminência dos tempos, que toda a Cristandade volva seu olhar para o farol de Cristo.
Vinde, todos vós, ó homens que vos iludis pensando possuir uma verdade diferente. Deus é a verdade única, substancialmente idêntica em todas as religiões, na ciência como na fé.
Se os caminhos, as aproximações são diferentes, o princípio e a meta são a mesma idéia pura e simples do amor fraternal, idéia tanto dominante no Evangelho como no universo. Os profetas afirmaram com variação de poder e aspectos o mesmo princípio.
A humanidade se encaminha para as grandes unidades políticas e espirituais. Que não surjam novas religiões e sim que as existentes se unifiquem numa fusão de fé que envolverá o mundo. O progresso se encontra no amor recíproco, que une, e nunca na rivalidade, que divide.
Paz, união e amor sejam convosco na minha bênção.
(Fonte: "Grandes Mensagens")
MENSAGEM AOS HOMENS DE BOA VONTADE
Pietro Ubaldi
(No XIX Centenário da Morte de Cristo)
Do alto da Cruz vos contemplo, homens de boa vontade, de todas as raças e crenças. Estas vos dividem; a minha palavra vos unifica.
Não falo somente aos Cristãos, porém a todos os meus filhos, que são os justos da Terra, qualquer que seja sua raça ou fé. Falo a todos, não considerando vossas diferenciações humanas. Minha palavra é universal como a luz do sol. A Divindade não se pode isolar numa igreja particular. Eu vos digo o que é verdadeiro e justo, e o que vos falo perdura a quem quer que seja dito. A mentira que me desfigura passa: eu permaneço. Não importa que a bondade seja explorada pelos maldosos; o Bem acaba triunfando. Eu amo a todos.
Vós, homens, buscais bandeiras limpas para transformá-las em mantos brilhantes. E quem pode impedir que, em vosso mundo de hipocrisias, os maus se escondam à sombra das coisas puras e que os falsos se acobertem sob os luzentes mantos de que se apossam? Então, as crenças e as religiões deixam de ser uma ideia, um princípio para se tornarem um aglomerado de interesses, uma organização de castas.
Assim, formastes hierarquias, seitas, ordens e grandezas que não tem correspondência no céu. Vossas classificações são absolutamente humanas, fictícias, de acordo com as aparências da Terra e não com os valores intrínsecos do espírito. Por isso, ficarão aí em vosso mundo e nunca se elevarão além da Terra.
Minha discriminação é diferente. Os escolhidos são aqueles que seguem meu caminho de dor e de renúncia, de humildade e de amor. Vinde a mim, vós que sofreis. Sois os grandes, os eleitos do Céu. Esta é a minha diferenciação. As que são feitas pelos homens não têm valor. Não importa o manto, mas o homem que a veste. Somente no caminho da dor e do amor encontrareis os que são grandes no meu Reino. Eis onde, na luta absurda entre tantas vozes e organismos contrários, achareis o bem, a justiça e a verdade.
Em toda parte, nos vossos agrupamentos, se encontram os bons e os maus; estes últimos, quase sempre, preocupados em tornar objeto de discussão uma verdade que não possuem. A verdade está no coração e nos atos e não nas formas e nas posições humanas.
Procurai o bem; procurai, onde quer que esteja, o homem, nunca o estandarte. Fazei questão do homem, da nua e intrínseca realidade de seus valores íntimos, e não dos sinais que o marquem exteriormente. Estes se podem falsificar, não o homem. A bandeira pode reduzir-se a um índice de interesses coletivos; o homem, porém, segue sozinho pelo caminho de seu destino.
Justos e injustos se encontram sobre a Terra, uns ao lado dos outros, para provações recíprocas; achá-los-ei juntos, usando todos o mesmo nome da verdade. Somente eu, que leio nos corações, os diferencio, como também pode fazê-lo a voz da vossa consciência, em que penetro e falo.
Os meus filhos estão, por isso, em toda a parte, contudo, não os sabeis enxergar. Só eu os vejo. A dor e a morte, que matam os outros, os elevam. A minha maneira de diferenciar está acima de todas as categorias humanas.
O meu Reino não é da Terra. O seu Rei não tem corpo físico. Os seus grandes nada possuem no mundo, mas sofrem e amam.
Minha religião mais profunda não tem forma terrena, não possui nenhuma dessas exterioridades, próprias da matéria e da imperfeição humana, e que sempre foram a base de todos os abusos.
O meu altar é a dor, a minha oração é o amor, a minha religião é a união com Deus no pensamento e nos atos.
Acima de todas as formas que vos dividem, ó homens da Terra, eu sou o princípio que vos une ao meu amor.
(Fonte: “Grandes Mensagens”)